jornalista que vê só caso pessoal vomita na própria profissão


Reinaldo Azevedo
Colunista do UOL
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Imagem: freepik

Volto ao assunto Alexandre de Moraes em Roma. Abordagens que tenho lido e ouvido em alguns veículos, vindas da pena e da voz de comentadores, são absolutamente irresponsáveis, escandalosamente temerárias e absurdamente levianas. Ameaçam a própria liberdade de informar.

Afirmar que aquilo a que se assistiu se limita a uma ofensa na esfera privada, a uma simples injúria, flerta com o vale-tudo. Digam-me: quando um jornalista é o alvo em razão de uma reportagem que faz, de uma denúncia que torna pública, trata-se de mera questão pessoal ou um valor mais alto se alevanta? Já não basta o xingatório nas redes? Milícias digitais agora vão se sentir à vontade para saltar do mundo virtual para o real para intimidar e para bater?

Por que entidades de defesa de jornalistas se manifestam, e com razão, quando isso acontece? Porque se tenta impedir o exercício de direitos garantidos pela Constituição: o de informar e o de ser informado. "Ah, Reinaldo, mas nem por isso se faz mandado de busca e apreensão na casa dos agressores!" A razão é simples: nós não somos um dos Poderes da República. De todo modo, penso que a legislação tem de ser mais severa.

Um projeto de lei deve ser apresentado ao Congresso para tornar mais duras as penas para quem agride autoridades ou atenta contra sua segurança e sua vida. É claro que eu apoio a iniciativa. E defendo que se punam também aqueles que recorrem à violência para silenciar o jornalismo.

Não! Não estou querendo blindar de críticas uma categoria profissional. As redes estão aí. Escrevam textos, produzam o que quiserem contestando repórteres e colunistas. O Código Penal prevê as sanções para crimes contra a honra. Ameaçar, bater, pôr a segurança de magistrados ou de profissionais da informação em risco? Aí não!

Assim como a investida contra um repórter ou colunista agride a imprensa como um todo, atos daquela natureza contra um membro do Supremo ferem o Poder Judiciário. "Oh, mas, então, não poderemos mais nos opor aos votos de Alexandre de Moraes ou de Gilmar Mendes?" Tenham paciência! Eu já critiquei dezenas de vezes — e outras dezenas virão — escolhas feitas por Nunes Marques. Mas não estimulei o "vá-lá-e-resolva-no-braço".

Se quero me opor ao doutor tecnicamente, recorro à caneta, ao teclado, a um vídeo, a meu programa de rádio. "Ah, mas o cidadão comum não é obrigado a fazer contraditas técnicas". Fato. Ocorre que xingar, constranger ou agredir um familiar são atos que pedem mais do que simples condenações retóricas. É essa a democracia que querem alguns coleguinhas?

A PALESTRA
"Ah, mas o ministro foi dar uma palestra promovida por uma empresa que..." Ora, continuem a noticiar e a comentar se acham isso grave. Pergunto: o que o caso tem a ver com a agressão? Esta se deu em razão da motivação que levou Moraes à Itália? Estivesse para se encontrar com o papa no Vaticano, outro teria sido o comportamento de desafetos a cuja existência ele certamente foi apresentado naquele dia?

Do modo como se encadeiam certos argumentos, tem-se a impressão de que a palestra e seus patrocinadores justificam os atos criminosos. Ainda que tudo fosse impróprio, aquelas pessoas não são juízes de linchamento. Quem vir ilegalidade que recorra aos meios disponíveis para pedir punição. Mas qual seria mesmo o motivo?


Quando um jornalista é hostilizado, quem está sendo convocado a se manifestar? Quando um integrante do STF é atingido por desatinos, o Poder Judiciário tem de dar resposta compatível. Nos dois casos, violam-se garantias que estão na Carta Magna. E isso pede mais do que as penas mamão-com-açúcar para os crimes contra a honra.

"Ah, no caso de Moraes, ainda não existe a lei que..." Existe, sim! Ele só foi alvo porque querem impedi-lo de exercer livremente o seu trabalho. E o Artigo 359-L do Código Penal prevê pena de até oito anos para quem age desse modo.

Fico envergonhado, já escrevi, quando vejo colegas de profissão a lamentar profundamente o ocorrido (só faltava o contrário!) — e há quem, por intermédio do silêncio sobre o mérito até aplauda —, mas com a ressalva de que não se deve confundir a investida contra um indivíduo com um ataque à instituição. É como defender que a violência contra um jornalista é só uma questão pessoal e nada tem a ver com a liberdade de imprensa. Lamento! É vomitar na própria profissão.

Um pouco mais de pudor, por favor!

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.


OLHAR APURADO

Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário. 

https://noticias.uol.com.br/colunas/reinaldo-azevedo/2023/07/24/moraes-roma-jornalista-que-ve-so-caso-pessoal-vomita-na-propria-profissao.htm

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