Bolsonaro leva ato de campanha ao funeral da rainha Elizabeth 2ª
Discurso a apoiadores e presença de pastor evangélico despertam críticas de oposição e imprensa internacional
Após discursar em tom eleitoral para um grupo de apoiadores em Londres, o presidente Jair Bolsonaro (PL), seguindo o rito de outros chefes de Estado, visitou o caixão da rainha Elizabeth 2ª neste domingo (18) e assinou o livro de condolências da soberana.
Nas ocasiões, Bolsonaro esteve acompanhado da primeira-dama Michelle,
transformada em peça-chave de sua campanha na corrida pela reeleição.
Na visita ao caixão, também esteve ao lado do pastor Silas Malafaia, aliado que integra a comitiva do presidente.

Mais cedo, falando da casa do embaixador do Brasil em Londres, Bolsonaro discursou a apoiadores que vivem na capital britânica.
Disse, entre outras coisas, que ganhará a eleição no primeiro turno, ainda que pesquisas de intenção de voto desenhem um cenário desfavorável a ele, que perde para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O presidente também participou de uma recepção no Palácio de Buckingham.
Ao lado de apoiadores que gritavam "o capitão chegou", disse que teve uma conversa breve com o rei Charles 3º, quando manifestou pesar pelo falecimento da rainha, morta no último dia 8.
O tom eleitoral da agenda despertou críticas da oposição e de ex-aliados. O ex-presidente Lula disse ser louvável que Bolsonaro tenha ido ao funeral, mas criticou que tenha usado o espaço para insuflar seus apoiadores com críticas a opositores.
Entre as frases que Bolsonaro ecoou, estava "Lula, ladrão, seu lugar é na prisão". "Em vez de ir para o velório da rainha, seria mais louvável se ele tivesse visitado familiares e órfãos das vítimas da Covid e se tivesse comprado vacinas no tempo certo", escreveu Lula em uma rede social.
A deputada federal Joice Hasselmann afirmou escreveu que Bolsonaro "transformou o funeral da rainha em um palanque".
A postura foi destacada na imprensa britânica. O The Guardian, referindo-se ao presidente como "populista sul-americano", lembrou que Bolsonaro expressou "profundo respeito" pela família real, mas logo mudou o discurso para a agenda de campanha.
Já o Daily Mail, no qual Bolsonaro é descrito como um governante populista de direita e integrante da lista de "líderes controversos" convidados para o funeral da rainha, relatou que o presidente fez uma espécie de comício. "Para ganhar pontos políticos em casa antes das próximas eleições", diz o texto.
A deputada Gleisi Hoffmann, presidente do PT, em linha semelhante, também teceu críticas. "[Bolsonaro] faz campanha eleitoral numa viagem oficial, custeada com recursos públicos", escreveu no Twitter. "Viajam com o presidente pessoas que não são agentes públicos, mas cabos eleitorais dele; um abuso de poder político e econômico."
Além de Michelle e Silas Malafaia, a comitiva brasileira é composta pelo empresário Fabio Wajngarten, que comandou a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) no governo Bolsonaro e hoje atua na campanha a reeleição, o padre Paulo Antônio de Araújo e o deputado federal por São Paulo Eduardo Bolsonaro, filho do presidente.

Malafaia, uma das mais importantes vozes no segmento evangélico, tem sido exaltado por Bolsonaro como conselheiro de campanha. Como outras figuras que rodeiam o presidente, também dissemina teorias infundadas a apoiadores, a exemplo da ideia de que possa haver fraude no sistema de urnas eletrônicas.
Nas redes sociais, o pastor publicou um vídeo com o embaixador brasileiro em Londres, Fred Arruda, no qual o diplomata diz ser uma "enorme honra ter Malafaia representando o Brasil" naquele momento, a despeito do fato de o país ser um Estado laico.
Levantando bandeiras conhecidas de seu governo e de sua trajetória política no Congresso, Bolsonaro falou a dezenas de apoiadores contra a legalização do aborto e a política de drogas. Ainda que seu mandato deixe como herança o endividamento e o agravamento da dívida, disse que a economia vai bem e também realçou a biodiversidade do país, embora o desmatamento tenha avançado em seu governo.

Ele também voltou a usar um mote de origem fascista que se tornou um dos slogans de sua campanha. "O nosso lema é Deus, pátria, família e liberdade", afirmou, adicionado o termo "liberdade" à frase adotada por fascistas da Ação Integralista e pela ditadura Salazar em Portugal.
O encontro com apoiadores rendeu a Bolsonaro postagens de figuras próximas nas redes sociais argumentando que o momento simbolizava exemplo de força do presidente. "Essa consideração é impagável", escreveu Eduardo Bolsonaro.
Em breve fala, Bolsonaro disse que o Brasil guarda na memória a viagem de Elizabeth 2ª ao país em 1968. Naquela, que foi a única passagem da soberana pelo Brasil, ela esteve com o então presidente Arthur da Costa e Silva, em cuja gestão foi decretado o Ato Institucional nº 5, que marcou o início do período mais repressor da ditadura militar.
Na terça (20), Bolsonaro estará em Nova York para participar da Assembleia-Geral da ONU, onde deve fazer o discurso de abertura. Nenhum encontro de peso, no entanto, está na agenda do presidente.