Como equilibrar mídia social com mídia comercial na comunicação do governo?

 

Balaio do Kotscho - 

Reunião ministerial: Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil, diz que "imprensa voltou a ter assunto" após 100 dias de governo  -  O Antagonista
Reunião ministerial: Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil, diz que "imprensa voltou a ter assunto" após 100 dias de governo Imagem: O Antagonista
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"Mídia comercial não será nossa aliada e o presidente Lula fará lives semanais após voltar da China", disse hoje o ministro-chefe da Secretaria da Comunicação Social, Paulo Pimenta, à TV 247.

A linguagem do ministro é meio beligerante: "Podemos confiar na mídia comercial? Nós sabemos que vamos ter uma oposição feroz. Boa parte da imprensa queria derrotar o Bolsonaro, mas não tem compromisso com o nosso projeto de transformação do país. Não podemos ter a ilusão de que a mídia será nossa aliada".

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Sim, mas e daí? Fiquei preocupado com essa declaração por dois motivos: a mídia comercial não precisa nem deve ser aliada ou inimiga de nenhum governo, mas apenas informar e opinar honestamente, com base em fatos reais, sobre o que está acontecendo no país e no mundo; por maior poder que as mídias sociais tenham conquistado nos últimos anos, elas por si só não garantem uma boa comunicação de governo, respeitando as regras do jogo.

Por uma razão muito simples: elas não precisam ser antagônicas, mas complementares, porque a mídia comercial ainda é a maior fornecedora das informações primárias, em que se baseiam grande parte dos comentários na mídia alternativa e nas redes sociais, até pelo presidente da República, e alcança 100% da população, em todas as regiões do país, enquanto a internet ainda não tem acesso universal nos lugares mais remotos e mais pobres.

Por isso, sempre digo que não adianta brigar com a imprensa. O governo sempre vai perder. Se você trata bem, vai continuar apanhando, porque a natureza da mídia é essa, criticar e fiscalizar os governos, qualquer um. Mas se você tratar mal e partir para o confronto, eles vão bater mais ainda, até te derrubar. Minha amiga Dilma que o diga. Entrou em conflito com o Congresso, o mercado, a mídia e os empresários, tudo ao mesmo tempo. E deu no que deu.

A ideia de usar as mídias sociais para o próprio presidente divulgar e defender ações do governo não é nova. Quando as lives ainda não eram chamadas de lives, no primeiro mandato de Lula, ele mantinha um programa semanal no rádio chamado "Conversa com o Presidente", gravado no Palácio da Alvorada pelo jornalista Luiz Fara Monteiro, também conhecido por Lula, e distribuído pela Radiobrás para todo o país.

Não pode ser responsabilidade apenas das mídias do governo, muito menos do presidente, contestar o noticiário da imprensa, em diferentes plataformas, com lives semanais ou outros meios oficiais, até porque, por qualquer toma lá dá cá, volta-se a falar em controle da informação, censura, ameaças à liberdade de expressão, e outras bobagens do gênero.

Essa deve ser uma tarefa também dos partidos e movimentos sociais da base do governo, e dos diferentes atores da sociedade civil, num entrechoque permanente de ideias e conceitos, confrontando informações e opiniões.

Cabe aos responsáveis pela comunicação do governo, qualquer governo, manter uma relação civilizada, republicana e respeitosa com todas as mídias, incluindo a comercial e as mídias alternativas, com exceção das chamadas milícias digitais. O mais importante é conversar, conversar, conversar sempre, com jornalistas de todos os níveis da hierarquia. Mesmo já não tendo o mesmo poder de antes, a velha mídia não pode ser ignorada nem tratada como inimiga, como Lula fez no segundo mandato, porque aí será pior.

Se não serve para ajudar, certamente pode atrapalhar bastante quem a hostiliza.

O mesmo que vale para o Congresso Nacional, o mercado e o Banco Central serve também para lidar com as mídias: informar e dialogar sempre, buscar entendimento e apoios para bons projetos, antes de dar murros na mesa e virá-la. Dá muito trabalho, eu sei, mas não tem outro jeito. O presidente Lula também sabe disso.

Para bem executar essa tarefa, é necessário que os comunicadores do governo não apenas divulguem, mas participem da tomada de decisões, ajudando a avaliar o impacto das medidas na opinião pública. Depois de feito o estrago, não adianta reclamar dos assessores.

Como já trabalhei nessa área, no primeiro mandato de Lula, sei como é difícil conciliar os interesses do governo com os da imprensa, pois são instituições de naturezas, objetivos e até fuso horários bem diferentes. Uma boa notícia, um "furo", depois do deadline de fechamento da edição no jornal ou na TV, não serve para nada.

Informação é, ou deveria ser, a única moeda de troca entre as fontes e os repórteres, uma via de duas mãos. Sabemos que nem sempre é assim, que há mil interesses em jogo dos dois lados do balcão da notícia, mas é preciso estabelecer uma linha de conduta ética que não pode ser ultrapassada. Isso vale, ou deveria valer, tanto para emissores como para receptores de informações. Nesse campo, o mais importante é manter a credibilidade.

Essas observações valem para uma situação de normalidade institucional, é claro, o que ainda não é o nosso caso, com as redes antissociais dos gabinetes de ódio correndo soltas por aí, alimentando a indústria de desinformação das fake news nas milícias digitais mesmo fora de épocas eleitorais. Cabe à polícia e à Justiça combater esses criminosos, como já está acontecendo.

Se, do outro lado, imperam o fascismo, a mentira, a violência e a manipulação de informações, é preciso que, do lado dos democratas, todos se unam novamente, apesar das divergências e das diferentes visões de mundo, como aconteceu no ano passado. Não é preciso nem que se aliem, mas, pelo menos, que se respeitem. Dizem que numa guerra a primeira vítima é sempre a verdade.

Nunca poderemos usar as mesmas armas dos extremistas. É suicídio lutar no campo deles.

Aliás, o melhor mesmo seria promover o desarmamento da população e dos espíritos, mas isso leva tempo.

Paz e bem.

Vida que segue.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

https://noticias.uol.com.br/colunas/balaio-do-kotscho/2023/04/10/como-equilibrar-midia-social-com-midia-comercial-na-comunicacao-do-governo.htm

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