PF identificou depósitos em dinheiro vivo de Cid para Michelle Bolsonaro

 

Aguirre Talento - 

Colunista do UOL

15/05/2023 04h00

A investigação da Polícia Federal sobre a suspeita de um esquema de desvio de recursos e rachadinha no Palácio do Planalto sob a gestão de Jair Bolsonaro identificou a realização de depósitos em dinheiro vivo para a então primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Esses repasses eram operacionalizados, de acordo com a PF, pelo ex-ajudante de ordens Mauro Cid, preso no último dia 3 de maio por suspeita de articular um esquema de fraude em certificados de vacinação.

A defesa de Jair e Michelle Bolsonaro negou irregularidades e afirmou, em nota, que tem "absoluta convicção que todos os pagamentos referentes ao dia a dia da família eram feitos com recursos próprios (leia abaixo).

  • UOL mostrou no sábado os diálogos de Cid com assessoras de Michelle Bolsonaro nos quais ele demonstra preocupação com os pagamentos das despesas da então primeira-dama, porque poderiam resultar em acusações de "rachadinha", e uma orientação para realizar despesas somente em dinheiro vivo.
  • Em outra reportagem, o UOL revelou que a PF identificou uma empresa com contrato na Codevasf como origem de recursos transferidos a um integrante do Palácio do Planalto responsável pelo pagamento das despesas de Michelle.

A Polícia Federal encontrou, em trocas de mensagens por WhatsApp, as imagens de sete comprovantes de depósitos em dinheiro vivo feitos por Cid, que foram encaminhadas às assessoras da então primeira-dama.

  • "A análise também identificou seis comprovantes de depósitos para a primeira-dama Michelle Bolsonaro no período de 8/3/2021 até 12/05/2021, realizados por meio de depósitos fracionados em caixas eletrônicos de autoatendimento e um comprovante de depósito em espécie, possivelmente no atendimento presencial. Os comprovantes foram localizados tanto no grupo de WhatsApp da Ajudância de Ordens da Presidência da República, quanto em trocas de mensagens", escreveu a Polícia Federal.
  • Os repasses totalizaram R$ 8.600,00. De acordo com a investigação, os depósitos usavam um método comum nos casos de rachadinha: eram feitos de forma fracionada, em pequenos valores, para impedir o alerta aos órgãos de controle e a identificação de irregularidades.
  • "Esses depósitos ocorreram predominantemente de forma fracionada, ou seja, o depositante ao invés de utilizar um único envelope com a quantia desejada, fracionou o valor total em dois envelopes distintos, realizando os depósitos de forma sucessiva em curto espaço temporal (minutos)", diz a investigação.
  • Como os pagamentos foram em dinheiro vivo, não há a identificação da origem dos valores. O inquérito apura se os pagamentos seriam provenientes do desvio de recursos públicos do Palácio do Planalto.
  • Também foi encontrada uma transferência bancária de R$ 5.000,00, realizada em julho de 2021, feita diretamente da conta de Mauro Cid para a conta de Michelle.
  • Por causa dessas transações, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes autorizou a quebra do sigilo bancário de Mauro Cid e outros servidores que trabalhavam na Ajudância de Ordens da Presidência. A quebra do sigilo bancário de Cid foi revelada em setembro do ano passado pelo jornal "Folha de S.Paulo". A PF busca identificar outras transações suspeitas envolvendo a primeira-dama e a Ajudância de Ordens.

Boletos do irmão

A hipótese de desvios de recursos da Presidência foi reforçada, na avaliação da PF, com a identificação de pagamentos de boletos para um irmão da ex-primeira-dama.

Em 1º de setembro de 2021, uma das assessoras de Michelle envia a Mauro Cid um boleto do plano de saúde do irmão da ex-primeira-dama. Neste primeiro caso, o ajudante de ordens realizou o pagamento com recursos da conta bancária de Jair Bolsonaro.

No fim daquele mesmo mês, entretanto, a assessora de Michelle novamente pediu o pagamento do boleto do plano de saúde do irmão dela, mas desta vez Cid respondeu com irritação e disse que aquela despesa não poderia ser feita pela Ajudância de Ordens. A mensagem de áudio foi interceptada pela PF:

Não tem como mandar esse tipo de boleto. (...) Quando for assim, me manda só o pedido do dinheiro e vocês pagam por aí, porque isso aí não é gasto do presidente, nem da dona Michelle! É, deve ser de um terceiro que ela está pagando aí a conta desse terceiro ai!.Mauro Cid, em resposta a pedido para pagar boleto de irmão de Michelle

Cid, porém, encaminha a demanda para a equipe da Ajudância de Ordens sacar os recursos para pagamento do boleto, apesar de não se tratar de uma despesa da Presidência da República. Para a PF, o fato é um indicativo do desvio de recursos do governo federal.

"Os elementos informativos colhidos demonstram que, apesar da despesa não ter relação com o Presidente da República nem com a primeira-dama, Mauro Cid anui e autoriza que o tenente Crivelatti (servidor da Ajudância de Ordens) encaminhe a quantia de R$ 590,91, oriunda da Ajudância de Ordens, à pessoa de Vanderlei para pagamento do plano de saúde tendo como beneficiário Yuri Daniel Ferreira Lima, irmão da sra. Michelle Bolsonaro", escreveu a Polícia Federal.

Orientação de Bolsonaro

Outra troca de mensagens mostra que o então presidente Jair Bolsonaro orientou Mauro Cid a efetuar o pagamento de um boleto em dinheiro vivo. Tratava-se de uma despesa hospitalar de Maria Helena Braga, tia de Michelle.

A investigação não identificou se os recursos para o pagamento do boleto saíram da conta pessoal de Jair Bolsonaro ou dos cofres da Ajudância de Ordens.

"No grupo de WhatsApp da Ajudância de Ordens, Mauro Cid encaminha orientação do Exmo. Sr. Presidente da República, no sentido de o pagamento da GRU ser feita em dinheiro para 'evitar interpretações equivocadas'", diz, em despacho sobre as quebras de sigilo, o ministro Alexandre de Moraes. Em seguida, um dos servidores da sua equipe faz o pagamento do boleto e lhe encaminha o comprovante, sem deixar claro qual teria sido a origem dos recursos.

Outro lado

Procurado, o ex-secretário de Comunicação do governo Bolsonaro e advogado da sua equipe de defesa, Fábio Wajngarten, afirmou em nota que os pagamentos referentes aos custos pessoais de Jair e Michelle eram feitos "com recursos próprios", negando o desvio de valores do Palácio do Planalto.

"A defesa reitera que pequenos fornecedores e/ou prestadores de serviços informais recebiam em espécie a fim de proteger a privacidade do ex-presidente, bem como evitar exposição desnecessária e riscos de fraudes", diz a nota.

Prossegue o advogado: "A defesa fará uma exposição detalhada de todos os custos, valores, saídas de recursos próprios do ex-presidente durante todo o período do mandato, nos 48 meses, a fim de evidenciar o quanto isso tudo se trata de uma perseguição política, com a apropriação e divulgação de vazamentos seletivos afim de constranger os envolvidos.

Wajgarten diz ainda, na nota, que "a maneira como as informações são repassadas, o aparecimento de novas 'evidências' e a suspeição permanente evidenciam que o único objetivo de todos os envolvidos é o de tentar macular a imagem do ex-presidente da República. Na falta de fatos concretos, como a devolução de bilhões de reais, como ocorreu na Petrobras, tenta-se criar um escândalo com despesas corriqueiras. A verdade prevalecerá".

O advogado de Mauro Cid, Bernardo Fenelon, afirmou em nota que "por respeito ao Supremo Tribunal Federal, se manifestará apenas nos autos do processo". 

https://noticias.uol.com.br/colunas/aguirre-talento/2023/05/15/pf-identificou-depositos-em-dinheiro-vivo-de-cid-para-michelle-bolsonaro.htm 

Entenda as suspeitas envolvendo pagamento de despesas de Michelle Bolsonaro

15/05/2023 16h04

Atualizada em 15/05/2023 17h09

Conversas entre Mauro Cid, ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e assessoras da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) indicam uma orientação oficial para o pagamento de despesas dela — a PF identificou depósitos com dinheiro vivo. Entenda como as suspeitas, reveladas pelo UOL, podem apontar desvios de recursos públicos.

1. Depósitos em dinheiro vivo de Cid para Michelle

Com a quebra do sigilo bancário de Mauro Cid, a PF encontrou informações suspeitas sobre movimentações financeiras. Elas se referem ao uso de dinheiro vivo e repasses para o pagamento de despesas relacionadas à então primeira-dama e a pessoas próximas dela.

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A PF ampliou o número de quebras de sigilos e chegou a assessoras de Michelle e integrantes da Ajudância de Ordens da Presidência. Os investigadores encontraram imagens de sete comprovantes de depósitos em dinheiro feitos por Cid que foram encaminhadas a assessoras de Michelle. Os documentos foram localizados em trocas de mensagens por WhatsApp.

Seis comprovantes de depósito para Michelle foram identificados entre 8 de março e 12 de maio de 2021. Foi identificado também um comprovante de depósito em espécie, possivelmente no atendimento presencial.

Os repasses totalizaram R$ 8.600,00. As investigações apontam que os depósitos usavam um método comum em rachadinhas: eram feitos de forma fracionada e em pequenos valores.

A PF também encontrou uma transferência bancária de R$ 5.000,00, realizada em julho de 2021. A movimentação foi feita da conta de Cid para a conta de Michelle.

2. Quais são as suspeitas de desvios de recursos

A possibilidade de desvio de recursos foi reforçada com a identificação de pagamentos de boletos para um irmão da ex-primeira-dama, segundo a PF. Uma das assessoras de Michelle enviou a Cid um boleto do plano de saúde do irmão de Michelle.

O documento foi enviado no dia 1º de setembro de 2021. O então ajudante de ordens realizou o pagamento com recursos da conta bancária de Bolsonaro. No fim do mesmo mês, a assessora de Michelle novamente pediu o pagamento do boleto do plano de saúde do irmão. Cid questionou, mas encaminhou a demanda para a equipe da Ajudância de Ordens sacar os recursos para pagamento.

Bolsonaro orientou Cid a fazer o pagamento de um boleto de uma despesa hospitalar de uma tia de Michelle, Maria Helena Braga, em dinheiro vivo. Outra troca de mensagens aponta a orientação do ex-presidente.

A quebra de sigilo bancário de Cid foi autorizada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes. Outros servidores que trabalhavam na Ajudância de Ordens da Presidência também tiveram o sigilo bancário quebrado em setembro do ano passado.

3. Qual a origem das transferências, segundo a PF

Uma empresa com contratos públicos na gestão Bolsonaro é apontada como local de origem das transferências feitas para um militar da Ajudância de Ordens, subordinado a Cid. O segundo-sargento Luis Marcos dos Reis fez saques em dinheiro para pagar despesas de um cartão de crédito usado por Michelle e efetuou ainda ao menos 12 depósitos em dinheiro na conta de uma tia da então primeira-dama.

Da Cedro do Líbano Comércio de Madeiras e Materiais para Construção saíram os depósitos de pelo menos R$ 25.360 na conta do sargento Dos Reis. A empresa tem sede em Goiânia e contratos com o governo federal — o principal deles é com a estatal Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba).

O dinheiro era depositado, segundo a PF, por Vanderlei Cardoso de Barros — que diz marido de uma sócia da Cedro do Líbano — nas contas do sargento Dos Reis. Quando o dinheiro caía na conta, o sargento sacava as notas em um caixa eletrônico. .

A defesa de Michelle negou que os recursos da Codevasf tenham bancado as despesas. "A dona Michelle não conhece esse ajudante de ordens [sargento Dos Reis]", afirmou o advogado Fábio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação de Bolsonaro.

4. A quem eram feitos os pagamentos

Três depósitos do sargento Dos Reis foram para a conta de Rosimary Cardosos Cordeiro, amiga de Michelle. À época, Rosimary era assistente parlamentar no gabinete do senador Roberto Rocha (PTB-MA).

Rosimary emitiu um cartão de crédito usado por Michelle. Ela recebia, ao menos até junho de 2021, depósitos em espécies, alguns deles, fracionados. O dinheiro era usado para pagar a fatura do cartão de crédito da então primeira-dama.

Outros depósitos foram realizados para a tia de Michelle, Maria Helena Graces de Moraes Braga.

Além de Dos Reis, outros militares também fizeram pagamentos com valores idênticos (R$ 2.840) e periodicidade regular.

5. Áudios indicam que gastos de Michelle eram pagos em dinheiro

Os diálogos entre Cid e assessoras de Michelle apontam a orientação de pagar as despesas dela com dinheiro. A preocupação de Cid era que a prática fosse caracterizada como um esquema de rachadinha porque não havia comprovação da origem dos recursos.

As conversas ocorreram por meio de áudios no WhatsApp. Os diálogos foram interceptados pela PF após a quebra de sigilo das comunicações de Cid.

6. O que a PF apurou

A PF investigou as transações financeiras de Cid e auxiliares do Planalto. A devassa chegou a indícios de um esquema de desvios de recursos públicos para bancar despesas de Michelle.

Os diálogos revelam "uma dinâmica sobre os depósitos em dinheiro para as contas de terceiros"As conversas mostram "a orientação de não deixar registros e impossibilidades de transferências".

Duas assessoras de Michelle, Cintia Borba Nogueira e Giselle dos Santos Carneiro da Silva, conversaram entre si e com Cid. As conversas expressavam preocupação sobre irregularidades no pagamento das despesas.

7. O que mostram os diálogos

"Situação do cartão é preocupante", disse Cintia a Giselle. No mesmo áudio, ela relata o que afirmou ter dito à então primeira-dama: "Dona Michelle, que é que a senhora acha da gente fazer um cartão para a senhora? Um cartão independente da Caixa. Pra evitar que a gente fique na dependência da Rosy. E aí a gente pode controlar melhor aqui as contas."

Outro trecho de um áudio de Giselle enviado a Cid mostra que Michelle manteve o cartão. "Segundo a dona Adriana, ficou pensativa, mas que vai continuar com o cartão. E ela falou que tem, tem os comprovantes assim, né?"

Em 25 de novembro de 2020, Cid disse que a situação das despesas de Michelle poderia ser alvo das investigações e cita o caso do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O filho do então presidente foi denunciado sob suspeita de peculato pelo MP-RJ.

Os áudios revelam que a sistemática adotada proibia os pagamentos com transferências bancárias. Para a PF, o uso de dinheiro vivo é indicativo de desvios de recursos públicos.

Outro áudio de Giselle enviado a Cintia afirma que Michelle dá ordens para que sejam realizados depósitos. "Ela falou que assim não fica registrado nada, vamos fazer depósito. Então a gente tem que começar a ter esse hábito do depósito, então, né?"

8. O que falta investigar

Os pagamentos em dinheiro não revelam a identificação da origem dos valores. O inquérito apura se seriam provenientes de desvios de recursos públicos do Planalto.

A PF busca identificar outras transações suspeitas envolvendo Michelle e a Ajudância de Ordens da Presidência.

9. O que diz a defesa dos envolvidos

O advogado Bernardo Fenelon, que defende Cid, afirma que se manifestará apenas nos autos do processo. Cid foi preso no dia 3 de maio por suspeitas de fraudar certificados de vacina da covid-19.

Wajngarten, que defende o casal Bolsonaro, negou irregularidades. O advogado diz ter "absoluta convicção de que todos os pagamentos referentes ao dia a dia da família eram feitos com recursos próprios.

O advogado diz que apresentará as movimentações financeiras. "A defesa fará uma exposição detalhada de todos os custos, valores, saídas de recursos próprios do ex-presidente durante todo o período do mandato."

Vanderlei de Barros, transferiu dinheiro ao sargento Dos Reis, disse ser amigo dele e que se trata de um "empréstimo". Afirmou, porém, que não sabia como dinheiro seria usado.

UOL não conseguiu localizar o segundo-sargento dos Reis nem as assessoras Giselle e Cintia.

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/05/15/suspeitas-pagamento-despesas-michelle-bolsonaro.htm

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