Ainda estamos aqui, mas eles também
Ainda estamos aqui, mas eles também
Ainda estamos aqui. 2024 entrará para a história com o ano com o maior número de eleições já vivido pela humanidade. Metade da população mundial - 3,7 bilhões de pessoas - teve a oportunidade de ir às urnas.
Mas se a democracia foi a palavra central do ano, 2024 também revelou que a extrema direita se consolidou como uma força em diferentes partes do planeta. Em alguns locais, ela venceu. Em outros, acabou sendo derrotada. Mas o movimento ultraconservador deu sinais de que, com uma agenda global, dinheiro e desinformação, passou a ser incontornável nos cálculos eleitorais e políticos.
Inflação, guerras e dificuldades econômicas alimentaram a narrativa de grupos de extrema direita para explorar a frustração do eleitorado diante de partidos tradicionais, que trocaram a missão de governar pela ambição do poder.
As ausências ou incapacidade de regular as redes sociais também contribuíram de forma decisiva.
Nos EUA, Donald Trump apostou na economia e no ódio, e venceu sem que sua campanha de desinformação jamais tivesse sido desmontada.
Na Europa, populistas passaram a dominar parte da agenda política. Seja com resultados expressivos nas urnas ou o sequestro do debate nacional. Para isso, recorreram às guerras culturais e a transformação de pautas de costumes em motivos de racha em sociedades.
Na Áustria, o Partido da Liberdade obteve 29% dos votos nas eleições de setembro e chegou em primeiro lugar. O resultado foi o melhor de sua história. Em Berlim, o Alternativa para Alemanha tornou-se o primeiro partido político de extrema direita a vencer uma eleição estadual desde o fim do nazismo.
Em Portugal, o Chega conquistou 50 dos 230 assentos no Parlamento. Em 2019, tinham apenas um. Na França, foi graças a uma ampla coalizão que a extrema direita de Marine Le Pen foi impedida de chegar ao poder. Mesmo assim, seu movimento cresceu de forma inédita.
Não por acaso, no começo desde ano de 2025, uma charge do cartunista Chappatte mostrava uma imagem de Jean Marie Le Pen, personagem da extrema direita francesa, e a data de sua morte. Ao lado, um coro de líderes da extrema direita do mundo anunciando orgulhosamente: "Ele nunca esteve tão vivo".
Em 2024, a democracia viveu um teste de estresse. Mas o veredicto sobre sua sobrevivência ainda é um ponto de interrogação, num mundo mais rachado do que nunca.
No centro do poder Ocidental, em Washington, um governo liderado por um populista e dotado do maior arsenal nuclear do mundo agora é também armado com as redes sociais, uma verdadeira engenharia de hackeamento das democracias.
Ainda estamos aqui. Mas eles também.
Opinião
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2025/01/12/ainda-estamos-aqui-mas-eles-tambem.htm