Acordo no Brics mencionará luta do Brasil por vaga no Conselho de Segurança

Jamil Chade
Colunista do UOL
Presidente Lula; BRICS
Presidente Lula; BRICS Imagem: Divulgação/Presidência

Uma das reivindicações mais antigas da diplomacia brasileira, a participação do Brasil no Conselho de Segurança da ONU será mencionada na declaração final da cúpula dos Brics, que será assinada nesta terça-feira na África do Sul.

No texto, o bloco vai defender a expansão do Conselho e citar a necessidade de que haja uma maior representação de América Latina, Ásia e África. O nome do Brasil também aparece de forma textual.

A informação consta de um último rascunho da declaração final da cúpula que conta com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e líderes da Rússia, China, África do Sul e Índia. O texto, segundo diplomatas, não deve sofrer alterações, salvo se algum dos países optar por abrir uma nova negociação.

O reconhecimento da candidatura brasileira ao Conselho era condição para que o país aceitasse a expansão dos Brics, um projeto essencialmente chinês.

Mas, diante da resistência de Pequim em uma participação da Índia como membro permanente no Conselho da ONU, não haverá uma consolidação do compromisso de que esses novos países façam parte necessariamente dos membros com direito a veto e voto, um privilégio que apenas EUA, França, Reino Unido, China e Rússia dispõem.

O acordo no texto que circula entre os membros foi a forma que os diferentes países encontraram para acomodar tanto as reivindicações do Brasil como o posicionamento chinês.

Novos membros

No rascunho do documento final, será dado o sinal verde para a adesão aos Brics de Arábia Saudita, Argentina, Egito, Emirados Árabes e Irã.

A ideia original era a adesão da Indonésia no bloco. Mas o governo de Jacarta apontou que, neste momento, não teria condições de iniciar o processo.


O processo de adesão de quatro regimes autoritários promete ampliar a resistência a qualquer debate sobre democracia, gênero ou direitos humanos no bloco.

Mas, em termos geopolíticos, representa um fortalecimento da aliança entre os emergentes e uma vitória clara da China em sua estratégia de ampliação de sua influência no mundo.

Moeda dos Brics

A declaração final ainda vai estabelecer um grupo de trabalho para começar a pensar no estabelecimento de uma moeda de referência como mecanismo de pagamentos. Não se trata de uma moeda física e nem de algo para substituir as moedas nacionais.

Mas, acima de tudo, um embrião de uma mecanismo que permita que o bloco possa realizar seu comércio sem passar pelo dólar.

O primeiro passo para isso, porém, seria o estabelecimento de uma espécie de unidade de referência de valor. Como o Brasil assume a presidência dos Brics em 2025, uma das possibilidades é de que os estudos estariam finalizados até la e que, então, caberia ao governo brasileiro anunciar os resultados dessa iniciativa.


Na esteira das transformações que os Brics querem promover, esse é um capítulo estratégico para que o comércio entre as cinco economias ocorra preferencialmente em moedas locais.

No futuro, isso reduziria o uso do dólar e a dependência em relação à moeda americana. Conforme os próprios diplomatas apontam, não se trata de uma questão financeira. Mas um posicionamento geopolítico de enormes proporções.

Para o governo americano, a redução do papel do dólar não significa apenas uma perda de hegemonia. Parte das sanções unilaterais aplicadas pelos EUA é no sistema financeiro, diante da presença dominante do dólar. Um país, portanto, pode ser asfixiado apenas ao ser impedido de usar a moeda americana.

Mas, se um sistema financeiro paralelo for criado com moedas alternativas, o poder da Casa Branca de impôr sanções é radicalmente reduzido.

Num seminário promovido neste fim de semana pelos sul-africanos, o brasileiro Paulo Nogueira Batista Jr. destacou como isso é usado.

"Houve uma instrumentalização do dólar como arma. Ou seja, o uso da moeda nacional/internacional e do sistema financeiro ocidental para atingir países hostis ou países vistos como tais", disse.


"Venezuela, Irã, Afeganistão e, em grande escala, a Rússia foram alvos de sanções e medidas punitivas que só puderam ser aplicadas porque o dólar e o sistema financeiro dos EUA ocupam a posição que ocupam no mundo", afirmou o economista.

Segundo ele, o caso da Rússia "não tem precedentes". "Após a invasão da Ucrânia, os EUA e seus aliados europeus decretaram o congelamento das reservas russas investidas em dólares e euros, no valor de cerca de US$ 300 bilhões, aproximadamente metade dos ativos internacionais líquidos da Rússia", disse.

"Evidentemente, o uso e o abuso da posição privilegiada do dólar levam a uma perda de legitimidade do sistema monetário internacional vigente. Isso causou uma erosão da confiança no dólar - e a confiança é um requisito indispensável para qualquer moeda. Em uma frase: os Estados Unidos são hoje o principal inimigo do dólar como moeda mundial", alertou.

Para ele, um ambiente propício para discussões sobre a reforma do sistema monetário e a desdolarização das transações internacionais foi "criado pelos próprios EUA".

Nome da moeda: R5

O brasileiro ainda desenhou o que poderia ser o caminho para uma moeda do bloco. Segundo ele, "a questão é complexa, ao mesmo tempo financeira e política".


Mas, pelo menos, um candidato para nome da moeda já existe. Aleksei Mozhin, diretor executivo russo do FMI, notou que as moedas dos cinco países começam todas com a letra "R" - real, rublo, rúpia, renminbi e rand. Sua sugestão, portanto, é que a possível nova moeda seja chamada de R5.

Segundo Nogueira Batista, a R5 começaria como uma unidade de conta, assumindo a forma de uma cesta das cinco moedas. "Os pesos das cinco moedas refletiriam aproximadamente os pesos relativos das cinco economias", disse.

O renminbi teria o maior peso na cesta, seguido pela rúpia, depois pelo real e pelo rublo, com o rand tendo um peso menor.

"A moeda chinesa poderia, para dar um exemplo ilustrativo, representar 40% da cesta; a moeda indiana, 25%; as moedas russa e brasileira, 15% cada; e a África do Sul, 5%", explicou..

Numa primeira etapa, o R5 poderia ser usado como unidade de denominação para determinadas transações e registros contábeis oficiais, além de ser adotado para substituir o dólar na contabilidade interna dos mecanismos financeiros criados pelo bloco.

Tanto o governo brasileiro como o economista apontam que nada disso significa que o R5 tenha uma existência física ou que um Banco Central dos BRICS seja criado. "O objetivo não seria criar uma moeda única que substituísse as cinco moedas nacionais", esclareceu o economista.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.


JAMIL CHADE

Todo sábado, Jamil escreve sobre temas sociais para uma personalidade com base em sua carreira de correspondente. 

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