Mesmo com redução da Selic, juros do crédito caem em ritmo lento
Mesmo com a redução da taxa básica de juros do país, a Selic, para o
menor nível histórico, os juros do crédito ao consumidor caem em ritmo
lento.
Na próxima semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) do
Banco Central (BC) vai definir a Selic novamente e a expectativa do mercado financeiro é de manutenção da taxa em 6,5% ao ano.
Em maio, após um ciclo de cortes que começou em outubro de 2016, o Copom optou por manter
a Selic em 6,5% ao ano. No início desse ciclo de reduções, a taxa
passou de 14,25% para 14% ao ano.
Entre outubro de 2016 e março deste
ano, quando ocorreu o último corte, a Selic caiu 54,4%. Enquanto isso, a
taxa média de juros para as famílias caiu 23,6%, ao passar de 74,33% ao
ano, em outubro de 2016, para 56,79% ao ano, em abril de 2018.
A taxa
do cheque especial, uma das modalidades de crédito mais caras, passou de
328,52% para 320,96% ao ano.
No Relatório de Econômica Bancária, divulgado esta semana, o BC
explicou que a Selic afeta os juros do crédito por meio de seu efeito no
custo de captação, que é o custo que as instituições têm para conseguir
dinheiro.
“Entretanto, o custo de captação é uma média de diversas
taxas de captação, que possuem maior ou menor ligação com a taxa Selic”,
diz o BC.
Por exemplo, quando o dinheiro para os empréstimos vêm das cadernetas
de poupança, o custo de captação está “bastante” ligado à taxa básica,
quando a Selic está abaixo de 8,5% ao ano.
Isso acontece porque a
remuneração da poupança muda quando a Selic está abaixo de 8,5% ao ano.
“O custo médio de captação depende também do volume de depósitos à
vista, que não possuem qualquer remuneração – e, portanto, nenhuma
conexão com a taxa Selic. Mas o custo de captação das instituições
financeiras envolve também a remuneração de instrumentos de captação
bastante ligados à taxa Selic, como CDBs [Certificados de Depósito
Bancário] indexados ao CDI [Certificado de Depósito Interbancário]”, diz
o BC.
Segundo a instituição, mesmo que reduções na taxa Selic sejam
repassadas integralmente para as taxas de juros das operações de
crédito, a queda nos custos do crédito será menor que dos juros básicos.
Isso porque a Selic é apenas um dos ingredientes na formação do custo
de crédito.
“E, quanto menor for a participação da Selic no custo do
crédito, como no caso de modalidades com altas taxas de inadimplência,
menor será o impacto em termos percentuais”, diz o relatório.
Na composição das taxas
de juros, segundo o BC, o custo da inadimplência responde pela maior
parte (38,27%), depois vêm as despesas administrativas (25,55%) dos
bancos, os tributos (22,13%) e o lucro (14,04%).
Concentração bancária
Para o professor de Finanças da Escola de Administração de Empresas
da Fundação Getulio Vargas (FGV) Fabio Gallo, os juros poderiam estar
mais baixos porque além de a Selic estar menor, a inadimplência das
pessoas físicas também caiu: passou de 6,16%, em outubro de 2016, para
5,08%, em abril de 2017. “Realmente a inadimplência é alta, mas tem sido
estabilizada para baixo nos últimos anos. Ainda temos perto de 60
milhões de brasileiros negativados, mas esse número não tem crescido”,
disse Gallo.
Para o professor, o problema está na concentração bancária,
com poucos bancos atuando no mercado.
Em 2017, os quatro maiores bancos
do país – Itaú-Unibanco, Bradesco, Banco do Brasil e Caixa Econômica
Federal – concentraram 78,51% do crédito do país. “A concentração
bancária explica muito isso. Os bancos podem manter o nível de ganhos
como desejarem”, diz Gallo.
O diretor executivos de estudos e pesquisas da Associação Nacional
dos Executivos em Finanças (Anefac), Miguel José Ribeiro de Oliveira,
também atribui à concentração bancária a dificuldade em reduzir os juros
mais rapidamente para o consumidor.
Ele destaca que houve muitas
incorporações de bancos nos últimos anos, reduzindo o número de
participantes no mercado. Ele cita também outros fatores, como baixa
oferta de crédito, carga tributária alta e os depósitos compulsórios
(recursos que os bancos são obrigados a deixar depositados no BC).
No
caso dos depósitos compulsórios, ele lembra que recentemente o BC reduziu o volume que precisa ser recolhido pelos bancos.
Para o BC, maior concorrência entre os bancos não requer
necessariamente menor nível de concentração bancária. “O Banco Central
monitora a concentração do Sistema Financeiro Nacional e está atento aos
riscos para o sistema e aos possíveis efeitos sobre o spread
[diferença entre taxa de captação do dinheiro pelos bancos e a taxa
cobrada dos clientes] bancário e outros preços. Entretanto, a relação
entre concentração e spreads não é tão direta quanto o senso
comum pode sugerir”, pondera no Relatório de Economia Bancária.
De
acordo com o BC, outros fatores estruturais são importantes para se
explicar o custo do crédito: despesas administrativas, impostos, margem
financeira (lucro) e inadimplência.
De acordo com o relatório, em 2016, o
Brasil estava no grupo de países com os sistemas bancários mais
concentrados, o que inclui Austrália, Canadá, França, Holanda e Suécia.
Queda gradual
Mesmo que a Selic seja mantida no atual patamar nesta semana,
Oliveira acredita que os juros ao consumidor vão continuar a cair, mas
seguirão em ritmo lento de redução. “As taxas de juros sobem de
elevador, bem rápido, e caem como se estivessem de escada, com um passo
de cada vez, muito lentamente”, disse Oliveira. Segundo ele, os juros do
crédito devem cair porque ainda estão muito altos. “Como subiram muito
antes e tem gordura para queimar, a tendência é que as taxas de juros
caiam mesmo com a manutenção da Selic. Serão pequenas quedas,
gradualmente, a não ser que o quadro externo ou político se agrave. Isso
pode trazer insegurança”, avaliou.
Para o professor da FGV, os consumidores só devem pegar empréstimos
se houver realmente necessidade. “Não é momento para ficar tomando
crédito. É um momento de muito risco, um grau de incerteza muito
grande”, disse.
Em nota, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse que as
instituições financeiras seguem “comprometidas com a melhoria do
ambiente de crédito no Brasil, contribuindo com estudos, propostas e
ações concretas para reduzir estruturalmente o spread”.
“Para
isso, é preciso atacar os custos excessivos que oneram a concessão de
crédito no Brasil, com ações que envolvam, também, o Legislativo, o
Executivo e o Judiciário”, destacou.
Para a Febraban, um estudo recente indicou que a razão principal pela qual os spreads
são mais altos no Brasil, em comparação a outros países, está nos
custos elevados da intermediação financeira.
“Os custos associados a
inadimplência, tributação, depósitos compulsórios e outros elementos do
sistema de regulação são bem mais altos no Brasil que em países
emergentes relevantes, como Chile e Turquia, por exemplo”, diz a
federação.
Por
Kelly Oliveira – Repórter da Agência Brasil
Edição: Denise Griesinger