Crise do Fies aumenta inadimplência nas universidades e diminui novas matrículas Em 2015, 8,8% dos estudantes das faculdades privadas estavam há mais de três meses com mensalidades atrasadas. Foi a primeira alta em sete anos. Além disso, houve redução de 6,9% de novos ingressantes.
Por Bárbara Souza
Além de dificultar o acesso dos estudantes ao ensino superior, a crise no Fundo de Financiamento Estudantil, o Fies, aumentou a inadimplência nas universidades particulares.
Além de dificultar o acesso dos estudantes ao ensino superior, a crise no Fundo de Financiamento Estudantil, o Fies, aumentou a inadimplência nas universidades particulares.
Em 2015, 8,8% dos estudantes das
faculdades privadas estavam há mais de três meses com mensalidades
atrasadas, segundo o Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior. Foi a
primeira alta em sete anos.
Em 2009, começou a ser registrada uma
sequência de quedas de alunos devedores. Mas a melhora foi interrompida
no ano passado, quando o governo mudou as regras do Fies.
Mesmo sem
conseguir o benefício, muitos estudantes resolveram se matricular em
cursos universitários e não conseguiram arcar com os custos, o que
afetou as contas, principalmente, de faculdades médias e pequenas.
Para
se adaptar ao novo momento e não perder alunos, a Universidade Castelo
Branco, no Rio, por exemplo, criou o próprio fundo de financiamento,
além de bolsas filantrópicas, como conta o analista financeiro da
instituição, Júlio Fernandes.
"Nós conseguimos vinculá-los a algum
programa dentro da instituição, como o financiamento estudantil que é
da própria universidade.
Temos outros tipos de financiamento e bolsas
filantrópicas. Nós ampliamos para dar chance aos novos alunos. Muito
ficaram desempregados".
A diminuição do número de matrículas e o
aumento da evasão escolar também podem ser fruto das mudanças no Fies.
Pela primeira vez em cinco anos, a entrada de novos estudantes nas
universidades diminuiu.
A queda na rede privada foi de 6,9%, contra 2,6%
na pública, segundo o Censo da Educação Superior, do Inep.
Desde março
do ano passado, o Fies passou a exigir nota mínima de 450 pontos no
Enem, além de mais de zero na redação.
O critério descarta a
possibilidade de cerca de dois terços dos candidatos pedirem o
financiamento.
Gabriel Cardoso teve que abandonar o curso de Engenharia
Elétrica após já ter feito a matrícula porque não se enquadrou nas novas
exigências.
A faculdade pediu o pagamento de duas mensalidades e, por
não poder pagar, ele trancou a matrícula.
"Desde maio que eles tinham
cancelado minha matrícula.
Eu já estava com dois meses atrasados.
Falaram que se eu não pagasse os dois meses, eles iriam me tirar da
faculdade. Eu não tinha como pagar e acabei trancando para ver se eu
conseguiria voltar depois".
A queda repentina das matrículas pelo
Fies deixou muitas faculdades endividadas. Segundo o diretor executivo
do sindicato que representa essas instituições, Rodrigo Capelato,
enquanto o Fies e o Prouni cresciam, os diretores resolveram investir e
ampliar a infraestrutura.
Porém, agora, com o aumento da inadimplência e
a redução dos programas, o retorno dos investimentos ficou mais
distante.
"As instituições vinham se
preparando para um crescimento que vinha acontecendo desde 2010, com o
financiamento estudantil bastante alto.
Então muitas investiram na
ampliação da infraestrutura, em novos laboratórios e novos prédios.
De
repente, de um ano para o outro houve uma queda muito forte e várias se
endividaram".
Em 2014, o Fies ofereceu mais de 700 mil
vagas. O número caiu para 287 mil no ano seguinte. Este ano, 148 mil
contratos foram firmados, 41% do anunciado pelo governo.
O CEO da Hoper,
que presta consultoria especializada no mercado de educação, William
Klein, avalia que o crescimento do Fies foi muito rápido, o que tornou o
programa insustentável.
Ainda segundo o especialista, para ter uma boa
saúde financeira, uma faculdade particular precisa ter, no máximo 25%
das matrículas através do Fies. Mas há instituições em que o total de
beneficiados chega a 70%.
"Toda a instituição de ensino que
tem mais de 25% dos matriculados usando o Fies etsá correndo risco. Já
era previso em 2014 que o crescimento que o governo vinha fazendo não
seria sustentável".
Além da dificuldade de acesso ao ensino
superior, os estudantes que conseguem entrar na faculdade enfrentam
problemas para se manter.
Quase metade dos estudantes (49%) que entraram
em 2010 desistiram do curso. As taxas de desistência têm crescido ao
longo dos anos.
As mudanças do Fies resultaram em evasão escolar já em
2015.
Além disso, o aumento do desemprego levou mais jovens a buscar
trabalho para ajudar suas famílias, deixando a faculdade em segundo
plano. Luiz Felipe Ribeiro, morador da Baixada Fluminense, conta que
abandonou a PUC, na Zona Sul do Rio:
Alunos da FMU passam a madrugada na fila para entregar documentação para ter direito ao Fies
Crédito: Joyce Ribeiro/CBN |
"Para conseguir ajudar em casa e me
sentir participando das coisas. Não quero ser um fardo com meu sonho.
Tem que entender até onde nosso sonho atrapalha a realidade dos outros".
No dia 19 de outubro, o governo abriu as
inscrições para renovação do Fies no segundo semestre após o Congresso
aprovar o projeto que deu crédito extra de R$ 700 milhões para o Fundo.
Os repasses do governo para as universidades estavam atrasados há quatro
meses, por causa de dívidas que o governo tinha com a Caixa e com o
Banco do Brasil.