Fabricantes descumprem resolução para evitar esmagamentos por vidros elétricos Equipamentos sem essa tecnologia já causaram mortes de crianças por estrangulamento. Embora no Brasil não haja dados oficiais sobre o assunto, uma ONG de segurança para crianças nos EUA contabiliza 84 mortes provocadas pelo fechamento de vidros elétricos de carros.

Dispositivo de segurança evita esmagamentos por vidros automáticos. Foto: Reprodução / TV Globo
Por Ricardo Gouveia

Desde 1º de janeiro de 2017 está em vigor uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito que proíbe a comercialização de vidros elétricos para carros sem um dispositivo de segurança que evite esmagamentos. Pela norma, os novos vidros devem parar de subir quando enfrentam alguma força contrária, caso prensem um braço ou, em casos mais graves, um pescoço. Mas, de acordo associações do setor, pelo menos cinco empresas não estão cumprindo a resolução. Duas delas já foram denunciadas ao Contran e as denúncias contra as outras devem ser entregues nos próximos dias.

As crianças são as mais vulneráveis aos acidentes com vidros elétricos. Embora haja casos de morte já relatados pela imprensa no Brasil, faltam dados oficiais sobre esse tipo de acidente. A ONG Kids and Cars, que se baseia em informações passadas por diversas entidades públicas dos Estados Unidos, começou a contabilizar esses casos nos anos 80 e, de lá para cá, já foram pelo menos 84 crianças mortas. Isso sem contar a quantidade de feridas.
Aqui no Brasil, a Istefânia Sodré viveu esse drama. O filho dela morreu em 2012, depois de passar três anos em estado vegetativo por causa de um estrangulamento provocado pelo vidro automático. Com três anos de idade, o garoto ficou sozinho por uns instantes e pegou a chave do carro:



"Fui tomar banho, me distraí e ele pegou a chave e foi para o carro sozinho. Ele entrou no carro, ficou no volante e apertou o controle. Acho que ele quis sair e colocou a cabeça para fora. O vidro veio e fechou no peito dele, só que como ele agonizou, o vidro foi para o pescoço. Ele ficou mais ou menos cinco minutos nessa situação. Quando o pai dele chegou da rua e procurou por ele, já o encontrou desfalecido", relata Istefânia.



A resolução do Contran que evitaria esse tipo de acidente já está em vigor, mas não é cumprida por algumas fabricantes de módulo de vidro. O caso já chegou ao Ministério Público Federal, além do Ministério Público do Paraná e investigações civis.
Uma das fabricantes, a Quantum, mudou seus manuais de instrução para driblar o texto resolução, que dispõe sobre o fechamento de vidros. A empresa diz agora que vende módulos para abertura e que se os consumidores usam para fechar vidros, eles é que aceitaram os riscos explicitados nos manuais. A Quantum afirma que, desta forma, respeita a resolução do Contran.
Associações do setor e familiares de vítimas solicitaram que o Conselho fizesse uma revisão do texto para evitar esse tipo de ambiguidade, mas, em um primeiro momento, o Conselho não atendeu ao pedido e solicitou que essas pessoas continuassem denunciando as irregularidades ao poder público. Mas agora, diante do Ministério Público Federal, o Departamento Nacional de Trânsito se propôs a estudar uma alteração no texto, e deve entregar uma resposta ao MPF na próxima segunda-feira. Questionado pela reportagem, o Denatran informou também que encaminhou a questão para o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, do Ministério da Justiça. 
Outra empresa é a Soft Eletrônica, que alega que a resolução não tem efeito de lei e que, portanto, não é obrigatória. O caso da Soft é analisado pelo Ministério Público Federal, MP-PR, além de ser alvo de outras instituições. Quem elaborou a denúncia contra a empresa é o advogado André Luis Romero de Souza, que afirma que as alegações da Soft não se sustentam:



"Várias empresas implementaram isso e outras acabaram por dizer que não vão cumprir, com o argumento de que não tem força de lei. Essa é a argumentação da Soft, por exemplo, que impetrou um mandado de segurança e perdeu esse mandado porque o TRF compreendeu que ela tem efeito de lei e deve ser cumprida", explica André Luis.



Procurada pela CBN, a Soft Eletrônica declarou que as questões envolvendo essa resolução do Contran estão ainda em análise na Justiça e que aguarda a decisão final do Poder Judiciário antes de se manifestar. 
As associações do setor e familiares que denunciaram a Quantum e a Soft Eletrônica ao Contran também elaboram denúncias contra outras três empresas: Commander, Sistec e Microcontrol.
A Commander nega descumprir a resolução. A Microcontrol informou que não vai comentar o caso, e a Sistec não respondeu aos questionamentos da reportagem.

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