Apesar de negar, Tarcísio de Freitas atuou nos bastidores pela derrubada da MP do IOF
Apesar de negar, Tarcísio de Freitas atuou nos bastidores pela derrubada da MP do IOF
Por Cleber Lourenço
Decidida a retirada da Medida Provisória sobre IOF da pauta Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (8), parlamentares oposicionistas confirmaram que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), foi um dos principais responsáveis pela derrota do governo. A medida previa aumento da tributação sobre bancos, fundos de investimento e apostas online, e era considerada pelo governo Lula essencial para reforçar a arrecadação e equilibrar as contas públicas.
O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), já tinha afirmado que o governador paulista telefonou para parlamentares e dirigentes partidários para pedir a derrubada da proposta.
Esse papel ficou claro quando o líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), foi à tribuna elogiar Tarcísio pelo “empenho” em dialogar com líderes de partidos de centro “contra o aumento de impostos”.
Antes da votação, Tarcísio tinha negado interferência nas articulações. “Neste momento, estou totalmente focado nos desafios e nas demandas de São Paulo”, declarou Tarcísio por meio de sua assessoria ao Broadcast Político. “Temos muitas ações e prioridades em andamento aqui no Estado, e essa questão cabe ao Congresso”. Pouco depois, o governador de São Paulo foi desmentido na tribuna da Câmara pelos próprios aliados.
O deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP) afirmou que Tarcísio teve participação direta e decisiva na articulação que levou à derrubada da Medida Provisória 1303, conhecida como MP do IOF. Segundo Zarattini, a derrota do texto não foi apenas um revés legislativo, mas um movimento político calculado para enfraquecer o Planalto e criar as condições de uma aliança da direita e do Centrão em torno de um projeto nacional com Tarcísio à frente.
Embora o governador tenha feito ligações diretas apenas a alguns poucos partidos, boa parte dos parlamentares do Centrão recebeu telefonemas de dirigentes partidários em nome do governador, entre eles Antônio Rueda (União Brasil) e Ciro Nogueira (PP).
“Deputados receberam telefonemas dos presidentes de partido, em nome do Tarcísio. Eles ameaçaram os parlamentares por causa do fundo eleitoral”, disse Zarattini. Segundo o petista, as ligações e mensagens feitas durante a madrugada antes da votação mudaram votos e quebraram um acordo construído ao longo da semana.
Zarattini também relatou que o governador paulista teria recorrido ao secretário de Governo de São Paulo, Gilberto Kassab, para influenciar a bancada do PSD no Congresso. De acordo com ele, Tarcísio pediu pessoalmente a Kassab que convencesse o partido a adotar uma postura menos favorável ao governo na votação. “O Tarcísio, via Kassab, enquadrou.
‘Você vai ter que trabalhar lá pra nós’. Botou o Kassab pra pressionar aqui. E ele próprio ligou para reforçar o pedido”, afirmou. Segundo o parlamentar, a atuação de Kassab teria contribuído para o recuo de parte da bancada, o que acabou isolando o relator e o governo, embora quase metade dos deputados do PSD ainda tenha votado com o Planalto contra a retirada da MP da pauta.
Esse movimento, segundo parlamentares governistas, rompeu um acordo fechado em um almoço na casa do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), com a presença do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e líderes do Centrão.
O entendimento previa que o texto seria aprovado com ajustes, reduzindo o impacto tributário sobre bancos e apostas, mas mantendo parte da arrecadação necessária. “Foi traição, foi rompimento de acordo”, disse Zarattini, acrescentando que o governo montou um ‘mapa’ dos parlamentares que romperam o compromisso e que haverá reação política: “Tem que tirar cargo desses que não foram fiéis”.

Tarcísio de Freitas
Tarcísio, Rueda e Ciro Nogueira
O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) também citou o envolvimento de Tarcísio e dos dirigentes Rueda e Ciro Nogueira. Segundo ele, o governador paulista “passou o dia ligando e articulando com presidentes de partido para derrotar a medida”. A ação, de acordo com o senador, fez parte de um movimento coordenado para transformar a votação da MP em um ato de oposição direta ao governo federal, unindo bancadas do Centrão e da extrema-direita em torno de um objetivo comum: fragilizar o presidente Lula e dar visibilidade a Tarcísio como alternativa da direita.
O deputado Rogério Correia (PT-MG) detalhou que o texto original da MP previa uma arrecadação de R$ 36 bilhões, mas que o relator havia fechado um acordo para reduzir esse valor para cerca de R$ 20 bilhões, diminuindo o alcance das taxações sobre bilionários, bancos e apostas. “Esse acordo estava praticamente feito. Aí o que aconteceu? Tarcísio, Rueda, etc., Tarcísio principalmente, disse que só seria candidato se todos se unissem contra o presidente Lula, antecipando um processo eleitoral de 2026 do Centrão com a extrema-direita”, afirmou Correia. Para o deputado, o movimento repete a aliança que se formou em torno da PEC da Bandidagem e do PL da Anistia a golpistas, reunindo forças conservadoras contra o governo.
O senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), líder do governo no Congresso Nacional, também criticou a articulação e classificou a ofensiva como uma “ação de sabotagem do Brasil”. Segundo ele, “o que está em jogo é uma ação de sabotagem do Brasil, coordenada pelo senhor Tarcísio de Freitas, entre outros personagens”. Randolfe afirmou que a votação da MP foi transformada em um “teste de lealdade à democracia e ao país” e que o Planalto vai avaliar medidas políticas para recompor a base.
Durante a sessão que confirmou a derrota do governo, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) subiu à tribuna para agradecer publicamente ao governador de São Paulo. Em discurso inflamado, ele disse: “Tarcísio, receba do alto da tribuna da Câmara dos Deputados o nosso reconhecimento, a nossa gratidão por todo o seu empenho. Você tem sido um gigante no diálogo com os presidentes de partidos de centro, para que a gente possa fazer essa coalizão”. O agradecimento do parlamentar foi aplaudido por aliados do governo paulista e interpretado nos bastidores como uma demonstração explícita da influência de Tarcísio na articulação que resultou na queda da MP.
Nos corredores da Câmara, a leitura é de que Tarcísio ainda não decidiu se será candidato à Presidência da República em 2026, mas aceitaria o papel de liderança natural da direita caso as condições se consolidem para sua candidatura. Parlamentares próximos ao governador dizem que ele não vê, no momento, um ambiente viável para disputar o Planalto, mas mantém canais abertos com lideranças empresariais e políticas que poderiam sustentar uma candidatura futura. Nesse contexto, o governador Ratinho Jr. (PSD-PR) tem funcionado como uma espécie de escudo político, apresentando-se como opção provisória para proteger Tarcísio do escrutínio antecipado e evitar que ele seja alvo direto do noticiário e da oposição.
Nos bastidores, membros da articulação política do Palácio do Planalto confirmam que Tarcísio tem mantido diálogo contínuo com lideranças do Centrão e é visto como o principal catalisador da rebelião parlamentar que derrubou a MP. Segundo auxiliares do governo, a ofensiva de Tarcísio contou com o apoio de setores do mercado financeiro e de apostas sediados em São Paulo, que pressionaram suas bancadas para barrar o texto. A avaliação dentro do Planalto é de que o governador se beneficiou do descontentamento desses grupos e transformou a pauta tributária em instrumento de afirmação política nacional.
Teste para o governador de SP
Em paralelo, aliados do governo avaliam que a movimentação também serviu para testar o alcance político de Tarcísio em Brasília. “Ele quis medir força com o Planalto e mostrar que tem interlocução real com o Congresso”, disse um integrante da articulação política. A avaliação é de que, embora o governador ainda negue ter pretensões presidenciais, seus movimentos recentes indicam disposição de ocupar o espaço deixado por Jair Bolsonaro, hoje inelegível.
Entre governistas, a atuação de Tarcísio é vista como parte de uma estratégia gradual de reposicionamento da direita, que busca reconstruir sua base eleitoral com o Centrão após a inelegibilidade de Bolsonaro. A avaliação é de que a derrubada da MP do IOF serviu como primeiro teste de fidelidade e força de articulação entre esses grupos. Um ministro ouvido pela coluna resumiu: “Eles transformaram uma votação fiscal em ensaio para 2026. Foi o primeiro ato de campanha, só que disfarçado de votação técnica”.
A MP 1303 era considerada fundamental pelo Ministério da Fazenda para garantir arrecadação em 2026 e evitar um rombo estimado em mais de R$ 30 bilhões nas contas públicas. Sua derrota representou não apenas uma perda fiscal significativa, mas também um marco político: consolidou Tarcísio como novo polo de influência da direita nacional e expôs o início de uma reorganização de forças entre o Centrão e o Planalto, com reflexos diretos na corrida presidencial que começa, silenciosamente, a se desenhar nos bastidores de Brasília.
https://iclnoticias.com.br/deputados-da-oposicao-confirmam-que-tarcisio/