"Ainda Estou Aqui": Fernanda Torres transforma figurino em símbolo de memória e justiça
MODA E CINEMA
As escolhas sóbrias e elegantes da atriz durante a campanha do longa destacam como as roupas podem amplificar e honrar a luta e a resistência de Eunice Paiva
A atriz Fernanda Torres conquistou a crítica e diversos prêmios por sua atuação no filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles. Além disso, destacou-se pelas escolhas criteriosas de figurino durante a campanha de divulgação do longa, demonstrando como a moda pode ser utilizada como uma poderosa forma de comunicação política e cultural.
Fernanda optou por looks sóbrios e elegantes, alinhados ao tom sério do filme, que aborda temas como a ditadura militar no Brasil e a luta por justiça. Suas escolhas de vestuário são um exemplo de como a moda pode ser usada conscientemente para transmitir mensagens significativas, ampliando o alcance da narrativa cinematográfica e estimulando uma reflexão mais profunda sobre os assuntos tratados no longa.
As roupas escolhidas carregam mensagens poderosas, funcionando como instrumentos de expressão política. No caso de Fernanda, suas decisões para os eventos de divulgação não apenas complementaram sua atuação, mas também prolongaram a mensagem de sua personagem, Eunice Paiva, para além das telas.
Essa abordagem contrasta com a tendência de usar a moda apenas como vitrine para exibir marcas de luxo ou tendências. Em vez disso, Fernanda demonstra que o figurino pode ser uma ferramenta estratégica para comunicar valores e temas relevantes, alinhando sua imagem pessoal à profundidade da narrativa.
A postura consciente da atriz reforça a ideia de que a moda vai muito além da estética. Trata-se de um meio de diálogo e reflexão sobre questões sociais e políticas. Ao optar por trajes que refletem a seriedade e a profundidade dos temas abordados no filme, Fernanda utiliza a moda como uma extensão da narrativa cinematográfica, intensificando o impacto da história que está sendo contada.
Essência de Eunice Paiva
Fernanda Torres e seu stylist, Antonio Frajado, adotaram uma abordagem conhecida como Method Dressing (leia abaixo), em que o vestuário reflete diretamente a narrativa do filme e a carga emocional dos personagens.
No caso de Fernanda, as peças escolhidas capturam a essência de Eunice Paiva, sua personagem em Ainda Estou Aqui. Eunice, advogada e ativista, enfrentou a perda de seu marido, Rubens Paiva, durante a ditadura militar no Brasil, dedicando-se a uma luta por justiça e memória em meio a tragédias pessoais e políticas.
As escolhas de figurino feitas por Fernanda foram pensadas para honrar a história de Eunice e do filme, explicou Frajado em entrevista ao G1.
"A roupa não pode, de forma alguma, ter excessos. O filme trata de uma tragédia que quase foi esquecida, e o figurino precisa respeitar e valorizar essa história", explicou.
Essa abordagem resultou em looks predominantemente sóbrios, com foco no preto — uma escolha que simboliza luto, sobriedade e a profundidade emocional da narrativa. As roupas, cuidadosamente selecionadas, complementam a atuação de Fernanda e ampliam a mensagem do filme para além das telas.
Entenda o Method Dressing
Method Dressing é uma abordagem em que as escolhas de figurino para eventos, como tapetes vermelhos ou campanhas de divulgação, refletem diretamente o personagem ou a narrativa do filme ou série que está sendo promovido.
Inspirado pelo método de atuação Method Acting, que busca uma imersão completa no personagem, o Method Dressing busca alinhar o vestuário da estrela ao espírito, à estética ou aos temas da obra cinematográfica.
Essa prática vai além de apenas selecionar roupas bonitas ou seguir tendências. O objetivo é criar uma conexão entre o figurino e a história, intensificando a imersão do público e destacando a essência da obra. Além disso, é uma estratégia para transformar a divulgação em uma extensão narrativa, gerando ainda mais impacto cultural.
O Method Dressing é uma estratégia que traz benefícios tanto para os atores quanto para os filmes ou séries que representam:
- Conexão emocional: A escolha do vestuário intensifica a conexão entre o público, o ator e a obra.
- Marketing narrativo: As roupas se tornam uma extensão da história, ajudando na divulgação do projeto de maneira criativa e envolvente.
- Impacto cultural: Roupas alinhadas ao enredo destacam a profundidade da narrativa, reforçando temas importantes e sensibilizando o público.
O Method Dressing mostra como a moda pode ir além da estética, tornando-se um veículo poderoso para contar histórias e ampliar o impacto cultural de obras cinematográficas.
Exemplos de Method Dressing:
Margot Robbie - “Barbie”
Durante a divulgação de Barbie, Margot Robbie levou o method dressing ao extremo. Em colaboração com sua stylist, ela recriou looks icônicos da boneca Barbie, desde o vestido rosa xadrez até o famoso conjunto de banho listrado em preto e branco. Essas escolhas não só destacaram o filme, mas também celebraram a nostalgia e o impacto cultural da personagem.
Zendaya - “Rivais”
Zendaya adotou o Method Dressing para divulgar o filme Rivais, em que interpreta uma jogadora de tênis. Durante a campanha, ela popularizou o estilo tenniscore, inspirado na moda das quadras de tênis, com roupas esportivas que incluíam saias plissadas e jaquetas esportivas. Apesar disso, para eventos formais, como o Globo de Ouro, Zendaya optou por looks elegantes e sofisticados, como o vestido laranja da Louis Vuitton.
Ana de Armas - “Blonde”
Na divulgação de Blonde, em que interpretou Marilyn Monroe, Ana de Armas incorporou o glamour icônico da estrela. Seus looks evocaram a estética da Era de Ouro de Hollywood, com vestidos ajustados, tecidos acetinados e acessórios vintage que remetiam diretamente ao estilo de Marilyn.
Blake Lively - “É Assim que Acaba”
Blake Lively recebeu críticas e elogios por suas escolhas de figurino durante a campanha de É Assim que Acaba. Interpretando uma florista, ela apareceu em vários eventos usando roupas com estampas florais, conectando seu estilo ao ofício da personagem. No entanto, críticos sugeriram que ela poderia ter adotado peças mais sóbrias para refletir os temas mais sombrios do filme, como a violência doméstica.
O figurino de "Ainda Estou Aqui"
O figurino de Ainda Estou Aqui desempenha um papel essencial ao transportar o público para o Rio de Janeiro dos anos 1970 e acompanhar as transformações temporais até os dias atuais.
Sob a direção da figurinista Claudia Kopke, conhecida por trabalhos como Que Horas Ela Volta? e Tropa de Elite, as roupas foram concebidas como elementos narrativos que refletem a evolução emocional e histórica dos personagens.
Baseado no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, o filme narra a trajetória de Eunice, que enfrenta o desaparecimento do marido durante o regime militar, além de lidar com o diagnóstico de Alzheimer nos anos posteriores.
Nesse contexto, o figurino de Claudia Kopke se torna vital para expressar as nuances e mudanças vividas pelos personagens ao longo de décadas.
Em entrevista ao GShow, a figurinista contou que o seu processo criativo começou com uma extensa pesquisa histórica.
"Realizamos um estudo detalhado utilizando internet, livros, revistas, filmes e muitas fotos da família Paiva. A partir disso, elaboramos as pranchas de figurino e apresentamos nossa proposta ao Walter Salles e ao diretor de arte Carlos Conti", revelou.
Essa pesquisa permitiu à equipe captar não apenas a estética das décadas retratadas, mas também os significados emocionais de cada peça.
Muitas roupas foram confeccionadas manualmente para garantir autenticidade, enquanto a escolha de tecidos e modelagens buscou equilibrar o espírito da época com um olhar contemporâneo.
Claudia, em participação em um podcast, destacou que suas memórias pessoais também influenciaram o projeto.
"Minhas lembranças de infância e adolescência estiveram muito presentes. Quando escolhia um tecido ou confeccionava uma peça, me transportava diretamente para as casas das costureiras que frequentava com minha mãe", afirmou.
Roupas contam histórias
Ao longo do filme, os figurinos desempenham um papel de conexão emocional. Eles capturam o espírito da época, as lutas de Eunice e as transformações sociais do Brasil. A sobriedade das roupas reflete a luta pela memória e pela verdade em um momento histórico repleto de desafios.
O trabalho cuidadoso de Claudia Kopke também tem recebido reconhecimento internacional. O filme, selecionado para representar o Brasil na busca por uma vaga ao Oscar 2025 como Melhor Filme Internacional, já figura em listas informais de possíveis indicados na categoria de Melhor Figurino. Esse reconhecimento destaca como o cuidado nos detalhes é essencial para produções que exploram histórias tão profundas.
Integração de tradição e modernidade
Assim como o figurino do filme refletiu décadas de história, Fernanda Torres e Antonio Frajado traduziram essa narrativa nos looks das premiações. A escolha de peças elegantes, minimalistas e repletas de significado reforça a conexão entre criador e criatura.
Esse comprometimento entre figurino, narrativa e atuação reafirma como o cinema é capaz de unir tradição e modernidade para contar histórias impactantes. Fernanda Torres e a equipe de Ainda Estou Aqui mostram que a moda pode ir além da estética, tornando-se uma poderosa ferramenta de memória e resiliência.
Premiação “Ainda Estou Aqui”
O filme "Ainda Estou Aqui" tem se destacado no cenário cinematográfico internacional, acumulando diversas indicações e prêmios prestigiosos. Confira a lista dos principais reconhecimentos recebidos pela produção:
Prêmios recebidos
Globo de Ouro 2025
- Melhor Atriz em Filme – Drama: Fernanda Torres tornou-se a primeira brasileira a vencer nesta categoria.
Prêmio APCA de Cinema
- Melhor Filme: "Ainda Estou Aqui" foi eleito o melhor filme pela Associação Paulista de Críticos de Arte.
- Melhor Atriz: Fernanda Torres recebeu o prêmio de melhor atriz.
Festival Internacional de Cinema de Palm Springs
- Melhor Filme Internacional: O longa foi reconhecido como o melhor filme internacional pelo júri do festival.
Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul
- Melhor Longa-metragem Nacional: "Ainda Estou Aqui" foi premiado como o melhor longa nacional.
Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro
- Melhor Filme do Ano: O filme foi consagrado como o melhor do ano pela ACCRJ.
Satellite Awards
- Melhor Atriz em Filme de Drama: Fernanda Torres foi reconhecida por sua atuação.
Associação de Críticos de Porto Rico
- Melhor Filme Internacional: O filme recebeu o prêmio de melhor filme internacional.
Indicações
Oscar 2025
- Melhor Filme: Primeira vez que uma produção brasileira é indicada nesta categoria.
- Melhor Atriz: Fernanda Torres foi indicada por sua performance.
- Melhor Filme Internacional: O filme representou o Brasil na categoria.
BAFTA 2025
- Melhor Filme em Língua Não Inglesa: O filme foi indicado ao prêmio britânico.
Prêmio Goya 2025
- Melhor Filme Ibero-americano: Indicação na principal premiação do cinema espanhol.
Critics' Choice Awards 2025
- Melhor Filme de Língua Estrangeira: O longa foi indicado nesta categoria.
Satellite Awards
- Melhor Filme Internacional: Indicação recebida pela produção.
Esses reconhecimentos destacam a relevância e a qualidade de "Ainda Estou Aqui" no panorama cinematográfico atual, evidenciando a força do cinema brasileiro no cenário internacional.
https://revistaforum.com.br/moda/2025/1/27/ainda-estou-aqui-fernanda-torres-transforma-figurino-em-simbolo-de-memoria-justia-173077.html