Elite operária do Brasil vive as incertezas da recessão econômica O ABC Paulista gira em torno da indústria automobilística. Quase 2,5 mil vagas foram fechadas nos primeiros quatro meses do ano. Operários relatam as perdas e as dificuldades que enfrentam após perderem os empregos.
Por Júlia Arraes
Valmir
Matias da Silva trabalhava como eletricista na fábrica da Mercedes, em
São Bernardo do Campo, há 26 anos. Depois de sair duas vezes em layoff,
ele foi demitido há nove meses e desde então, a situação da família não
tem sido fácil.
‘Depois de
uma vida lá dentro eu fiquei muito abalado. Mas, a gente está se
superando, cada dia matamos um leão para poder sobreviver’, conta
Valmir.
Valmir
conta que, com o dinheiro da indenização, comprou um caminhão caçamba
para trabalhar com remoção de entulho de construções, mas nem sempre as
contas fecham no fim do mês.
Para ajudar na renda da família, a mulher dele também começou a trabalhar como vendedora de cosméticos.
‘Ela não
tinha a necessidade de estar trabalhando.
O motivo é por causa da renda
porque as contas chegam e o dinheiro que estou recebendo não dá para
suprir tudo no momento. Comprei um caminhão de entulho, mas por causa da
crise ninguém está construindo então está devagar. Graças a Deus dá
para comer’, explica Valmir.
Esta
semana, a Mercedes já anunciou que vai demitir mais 2 mil funcionários
ainda em 2016.
A empresa abriu um Programa de Demissão Voluntária e
também já colocou em licença remunerada um grupo de cerca de 1.800
empregados por tempo indeterminado.
Na Ford e na Volkswagen, a situação também não é muito diferente.
O Programa
de proteção ao emprego da Ford está em vigor até o dia 30 deste mês e
eles ainda não informaram se vão renová-lo. Na Volkswagen, o PPE é
válido até o mês de setembro.
A economia
do ABC Paulista gira em torno das montadoras e a crise no setor tem
desestabilizado toda a região. O PIB do ABC, por exemplo, cresceu apenas
0,09% nos últimos cinco anos.
Ivan dos
Santos trabalha como montador há 31 anos na Volkswagen e há três meses
entrou na quarta turma de layoff da empresa. O medo de não voltar ao
chão de fábrica é constante.
Apesar de
continuar recebendo o salário integral, ele afirma que as pessoas da
região do ABC vivem um clima de incertezas e ele já perdeu as contas de
quantos colegas ficaram desempregados nos últimos dois anos.
‘Quando eu
entrei no layoff as outras empresas já estavam dando layoff e eles não
estavam voltando. Sinceramente, acho que não volto não porque a situação
só piora.
Já girou praticamente todos os funcionários e estão saindo os
funcionários que saíram primeiro. Uma hora a corda vai quebrar. Tenho
amigos que têm só dez anos de carteira registrada e estão com medo de
serem mandados embora.
Também tenho vários amigos desempregados’, diz
Ivan.
Só no
último mês de maio, 1.360 vagas de emprego do setor automobilístico
foram eliminadas no país. Considerando os últimos 12 meses, são 10.208
vagas a menos no Brasil. O número atual de funcionários do segmento
voltou ao nível de 2010.
De janeiro até abril deste ano, quase 2.500 vagas foram fechadas somente na região do ABC.
Segundo o
presidente do Sindicato dos Metalúrgicos da região, Rafael Marques, o
diálogo com as empresas é constante.
Mas ele cobra ações do governo
federal para reorganizar a demanda do setor.
‘Não há um
mercado absolutamente parado, o que existe é um problema que se bem
tratado a gente consegue destravar o setor.
Principalmente no caso de
automóveis, crédito e juros são questões que se conseguíssemos tomar
alguma medida acho que recuperaríamos a produção de carros novos em um
curto ou médio prazo’, diz Marques.
Esta semana, a Anfavea afirmou que o setor deve encolher 19% em 2016 e este deverá ser o quarto ano consecutivo de quedas.
Montadora Ford
Crédito: Renata Carvalho |