Mauro Cid vai confessar que Bolsonaro mandou vender joias e recebeu dinheiro vivo, diz advogado


Mudança na estratégia de defesa acontece após entrada de novo advogado no caso, contratado pela família de Cid na terça-feira

Depoimento do tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid na CPMI do 8 de janeiro
Depoimento do tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid na CPMI do 8 de janeiro Edilson Rodrigues/Agência Senado

Basília Rodrigues da CNN

em Brasília
17/08/2023 às 20:31 | Atualizado 17/08/2023 às 22:10

Em uma reviravolta no caso das joias, o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL) Mauro Cid decidiu confessar que o ex-presidente mandou que ele vendesse as joias dadas de presente pela Arábia Saudita ao governo brasileiro.

A informação foi inicialmente publicada pela Revista Veja e confirmada pela CNN com o advogado Cezar Bitencourt. “Eu só digo uma coisa: Mauro Cid é inocente”, afirmou. “É evidente que Bolsonaro é quem deu a ordem. Cid, como um militar disciplinado, seguiu ordens”, adicionou o advogado.

De acordo com a defesa, o ex-presidente teria dito “resolve lá” para Mauro Cid negociar a venda de joias e relógios.

Bitencourt assumiu a defesa de Mauro Cid na terça-feira (15), a pedido da família do tenente-coronel. O criminalista é o terceiro advogado a representar o caso.

Após reunião de Cid com o novo advogado, ele foi aconselhado a abrir o jogo devido ao conjunto de provas reunidas até o momento pela investigação e à possibilidade de ser o maior responsabilizado.

De acordo com a nova versão que será apresentada por Mauro Cid, Bolsonaro teria pedido para o auxiliar resolver a venda das joias. O dinheiro da comercialização teria sido repassado a Bolsonaro em espécie, para não deixar rastro.

Criminalista há 40 anos, autor de livros sobre Direito Penal, Bitencourt disse ainda que vai se reunir com o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

O advogado defende que a confissão por livre e espontânea vontade tem a capacidade de atenuar a pena que poderá ser imposta a Cid.

Outro lado

CNN entrou em contato com a defesa de Jair Bolsonaro e aguarda retorno.

Já o advogado Cezar Roberto Bittencourt, que defende o tenente-coronel Mauro Cid, disse que o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro era um assessor que cumpria ordens do chefe.

“Mauro Cid, como assessor, segue ordens, cumpre ordens do chefe. [Cid] não tinha como se desvincular. Ele assessorava o presidente numa variedade de situações, além inclusive da função oficial. Quer dizer, ele servia para tudo”, declarou Bitencourt.

VÍDEO – Mauro Cid era assessor e cumpria ordens do chefe, diz à CNN advogado de ex-ajudante de ordens

Mauro Cid era assessor e cumpria ordens do chefe, diz à CNN advogado de ex-ajudante de ordens | LIVE

Entenda o caso

Uma investigação da Polícia Federal (PF) aponta que Cid, que está preso desde o dia 3 de maio, levou para os Estados Unidos presentes de alto valor recebidos por agentes públicos brasileiros de autoridades árabes com a intenção de vendê-los.

Segundo a PF, a suspeita é de que a conta do pai do ex-ajudante de ordens teria sido usada para recebimento de valores relativos à venda dos presentes. Nesta conta teriam sido depositados R$ 68 mil.

A investigação “identificou que esse modus operandi foi utilizado para retirar do país pelo menos quatro conjuntos de bens recebidos pelo ex-Presidente da República em viagens internacionais, na condição de chefe de Estado”, aponta o relatório.

As apurações mostram trocas de mensagens escritas e gravadas entre os suspeitos de fazerem parte da suposta organização criminosa. Também foram reunidas fotos dos objetos, que incluem relógios, estátuas e kits de joias.

VÍDEO — Entenda a venda ilegal de joias da Presidência

Entenda a venda ilegal de joias da Presidência | CNN PRIME TIME

Também foi dito pela PF que o pai de Cid foi o responsável pela venda das joias nos Estados Unidos, e que Crivelatti era o responsável por cuidar das joias sauditas e da manutenção dos objetos, que eram deixados em um acervo criado em uma fazenda em Brasília.

De acordo com a lei, os presentes recebidos pelo presidente da República ou integrantes do governo durante viagens e compromissos oficiais devem ser registrados no acervo da Presidência como de interesse público e incorporados ao patrimônio cultural brasileiro.

A exceção, segundo a legislação, são itens que podem ser consumidos, como frutas típicas ou bebidas, e os considerados de uso personalíssimo, como roupas e perfumes.

Ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Polícia Federal (PF) diz ter “fortes indícios” de utilização da estrutura do Estado brasileiro para “desviar de bens de alto valor patrimonial entregues por autoridades estrangeiras ao presidente da República ou agentes públicos a seu serviço” e “posterior ocultação da origem, localização e propriedade dos valores provenientes, com o intuito de gerar o enriquecimento ilícito” de Bolsonaro.

A PF diz que o dinheiro era recebido por meio de pessoas interpostas e sem usar o sistema bancário formal, com o objetivo de ocultar a origem, localização e propriedade dos valores.

Para os investigadores, os fatos investigados configuram, em tese, os crimes de peculato e lavagem de dinheiro. Nem todos os itens teriam sido vendidos, mas, mesmo assim, o esquema teria movimentado mais de R$ 1 milhão.

Um dos itens citados pela investigação é um relógio da marca Rolex, dado a Jair Bolsonaro em 2019. Esse relógio chegou a ser vendido a uma empresa nos Estados Unidos, mas, após o caso vir à tona e o Tribunal de Contas da União (TCU) exigir que o objeto fosse devolvido, ele foi recomprado pelo ex-advogado de Jair Bolsonaro Frederick Wassef.

O inquérito também cita um áudio em que Mauro Cid diz que o pai dele estaria na posse de R$ 25 mil dólares que supostamente pertenceriam ao ex-presidente, e que esse dinheiro deveria ser entregue em espécie.

Ainda segundo a corporação, na gestão de Bolsonaro, o Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH) adotou interpretação contrária aos princípios que regem a administração pública e que o órgão foi usado para “legalizar” a incorporação dos bens de alto valor presenteados por autoridades estrangeiras ao acervo privado de Bolsonaro.

“O referido entendimento firmado pela GADH, na gestão do ex-presidente da república Jair Bolsonaro, além de chancelar um enriquecimento inadmissível pelo Presidente da República, pelo simples fato de exercer uma função pública, proporciona a possibilidade de cooptação do chefe de Estado brasileiro, por nações estrangeiras, mediante o recebimento de bens de vultosos valores”, diz a Polícia Federal.

Ainda segundo os investigadores, o GADH foi usado pela gestão Bolsonaro para “desviar os bens de alto valor” recebidos pelo então presidente para, posteriormente, “serem evadidos do Brasil, por meio de aeronaves da Força Aérea brasileira e vendidos nos Estados Unidos”.

“Datos que, além de ilícitos criminais, demonstram total desprezo pelo patrimônio histórico brasileiro e desrespeito ao Estado estrangeiro, cujos presentes ofertados, em cerimônias diplomáticas, podem retratam aspectos de suas culturas e representa um gesto de cortesia e hospitalidade ao Brasil, representado naquele momento pelo presidente da República”, diz a PF.

Em sua decisão, Alexandre de Moraes afirma que a Polícia Federal trabalha com a possibilidade de o GADH ter sido “utilizado para desviar, para o acervo privado do ex-presidente da República, presentes de alto valor, mediante determinação de Jair Bolsonaro”. Além disso, o ministro também diz que os investigadores trabalham com indícios de que alguns presentes recebidos por Bolsonaro “teriam sido desviados sem sequer terem sido submetidos à avaliação do GADH”.

*publicado por Tiago Tortella, da CNN

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