Lula cobrará de países ricos em NY proteção ao clima e pedirá nova ONU

Lula cobrará de países ricos em NY mais dinheiro ao clima e pedirá nova ONU



Lula durante entrevista coletiva na Índia depois durante o encontro do G20
Lula durante entrevista coletiva na Índia depois durante o encontro do G20 Imagem: Ricardo Stuckert/PR

Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) subir ao púlpito da ONU para abrir nesta terça-feira, às 10h, a Assembleia Geral das Nações Unidas, uma de suas missões será a de tentar restabelecer o Brasil como protagonista na política internacional e virar a página de quatro anos de discursos que foram recebidos com espanto e desprezo.

Mas ele também usará o palco mais importante da diplomacia mundial para fazer duras cobranças aos países ricos, denunciando a desigualdade estrutural como fator central das crises que hoje assolam o planeta e da desconfiança entre governos.

O Brasil pedirá que as economias ricas assumam suas responsabilidades na ajuda aos emergentes para realizar sua transição energética e para que cumpram suas promessas no Acordo do Clima de Paris, que aceitem uma nova realidade política no mundo e que abram espaço para uma reforma da ONU.

Para completar, quer recursos dos mais ricos para colocar fim à fome e pobreza extrema até 2030. Numa versão preliminar, o discurso ainda denunciava a situação da dívida dos países africanos, considerada como impagável e sugeria, de forma implícita, um redesenho da governança global.

Falas polêmicas e o desejo de uma nova diplomacia

Sem as presenças dos líderes de China e Índia, Lula ainda quer usar o espaço para se posicionar como o legítimo representante dos países em desenvolvimento.


Mas as polêmicas em relação às falas do brasileiro questionando o Tribunal Penal Internacional ou sugerindo que a Ucrânia ceda parte de seu território, além da exploração de petróleo na foz do Amazonas, levantam resistências por parte de grupos pouco dispostos a ceder espaço nos bastidores da diplomacia.

Fontes no Palácio do Planalto e no Itamaraty apontam que o discurso de Lula será o posicionamento mais completo da nova política externa brasileira e determinará as prioridades e rumos da diplomacia para os próximos anos.

A fala está sendo acompanhada por ação. A ordem do Palácio do Planalto é que cada ministério se engaje em seus respectivos setores para voltar a colocar o Brasil no centro do debate, seja nos temas financeiros, de saúde, de paz ou na questão comerciais. No total, 13 ministros estão em Nova York nesta semana.

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Ao longo do mandato de Jair Bolsonaro (PL), entre 2019 e 2022, o governo usou o momento mais aguardado da diplomacia brasileira para falar essencialmente para seu público doméstico, com ataques contra o "socialismo", o "globalismo" e referências a Deus e família.

Quando a mensagem era à comunidade internacional, Bolsonaro abriu crises e gerou protestos. Icônica foi a imagem de uma Angela Merkel, então chanceler alemã, desconfortável ao ouvir o ex-presidente discursar, ainda em 2019.

Em falas repletas de desinformação ataques contra as instituições, Bolsonaro ainda colecionou polêmicas e chegou a repetir frases inteiras de discursos proferidos por Donald Trump, o ex-presidente dos EUA.

Lula, em seu terceiro mandato como presidente, quer marcar sua volta à ONU com um discurso e uma operação nos bastidores que represente o retorno do Brasil às mesas de negociação e à definição dos grandes temas mundiais.

Para isso, o presidente desembarca com temas globais e tentando reposicionar o Brasil como protagonista.


Lula vai defender cinco pontos fundamentais, com fortes cobranças aos países ricos:

O combate contra a desigualdade e contra a fome

O presidente vai insistir que, sem lidar com essas questões, não haverá como superar algumas das principais crises internacionais. Lula ainda destacará a volta da fome e apontará para a concentração de renda.

As metas de desenvolvimento social estabelecidas pela ONU para 2030 não devem ser atingidas se o atual ritmo de progresso for mantido — hoje apenas 15% das metas podem ser cumpridas. A ONU estima que o mundo precisará de U$ 500 bilhões por ano para lidar com esses desafios, e o dinheiro terá que vir dos países ricos.

No caso da fome, a meta de erradicar o problema até 2030 sofreu um forte abalo com a pandemia da covid-19 e o corte de recursos de doadores internacionais. Mais de 720 milhões de pessoas vivem em condições de fome extrema.

Ucrânia e Paz

Lula deve indicar que o Brasil tem um compromisso com o direito internacional, com a Carta das Nações Unidas e que condena a agressão a um Estado soberano. Mas, numa mensagem ao ocidente, pedirá que as atitudes sejam repensadas e que as preocupações legitimas de russos e outros países sejam consideradas.


Também criticará o fato de que a comunidade internacional concentrar seus esforços na crise em Kiev, abandonando dezenas de outras situações emergenciais, como no Haiti.

Nesta quarta-feira, após desencontros e um mal-estar diplomático, Lula e Volodymyr Zelensky vão finalmente se reunir para sua a primeira conversa bilateral de forma presencial.

Clima, compromisso do Brasil e promessa dos ricos

O governo brasileiro vai anunciar que abandona os compromissos climáticos de Bolsonaro e que metas mais ambiciosas serão traçadas. Mas também fará duras cobranças aos países ricos para que assumam seus compromissos de US$ 100 bilhões por ano para ajudar os emergentes a promover a transição energética.

Reforma da ONU e um novo espaço para emergentes

Num esforço de recuperar a credibilidade da ONU, Lula insistirá que a entidade apenas terá função se passar por uma reforma que permita que os emergentes tenham mais voz. Seu apelo principal é para que as potências do Conselho de Segurança aceitem uma reforma, com novos membros. O Brasil é um dos candidatos.

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Democracia

O discurso ainda deve apontar para as ameaças que sofrem as democracias e destacará como o Brasil consolidou o estado de direito ao conseguir evitar um golpe de estado e processar os responsáveis pelo 8 de janeiro.

E um pedido por um redesenho mundial

Pessoas que estiveram envolvidas no processo de coleta de informações para subsidiar a elaboração do discurso destacam ainda que a fala foi tratada no governo como o "ápice" da formulação da política externa de Lula.

Sua construção, porém, atravessou algumas etapas. Num primeiro momento, Lula questionou em seus discursos aos líderes estrangeiros o fato de que o sistema internacional está falido. Ele, porém, passou a alertar que um mundo dividido em blocos e com polos hegemônicos não interessaria aos países emergentes. Por fim, passou a denunciar o desequilíbrio global e a ausência dos emergentes nas decisões do planeta.

Agora, sua fala vai sugerir a necessidade de um redesenho da ordem internacional.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.


JAMIL CHADE

Todo sábado, Jamil escreve sobre temas sociais para uma personalidade com base em sua carreira de correspondente. 

https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2023/09/18/lula-cobrara-de-paises-ricos-em-ny-mais-dinheiro-ao-clima-e-pedira-nova-onu.htm

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