Josias de Souza - Caso das imagens do Planalto expõe falhas da investigação sobre o 8/1


O interesse tardio pelas imagens captadas pelo circuito interno de filmagens do Palácio do Planalto expõe uma incômoda evidência: os responsáveis pela condução dos inquéritos sobre o 8 de janeiro falharam clamorosamente. 

Por que só agora?, eis a pergunta que a Polícia Federal, a Presidência da República e, no limite, até o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes precisam responder.

No depoimento de quase cinco horas que prestou à Polícia Federal, o general Gonçalves Dias declarou que entregou, sem cortes, todas as imagens registradas pelas câmeras de segurança do circuito interno do Planalto às "instituições de Estado". A própria PF, seguindo ordens de Moraes, recolhera as gravações na noite do quebra-quebra. Já la se vão mais de 100 dias. A interrogação ressoa: Por que só agora?

O súbito interesse foi despertado por reportagem da CNN. A emissora expôs trechos desconhecidos das fitas. Neles, um aparvalhado Gonçalves Dias, então chefe do Gabinete de Segurança Institucional, aparece desfilando sua complacência em meio aos criminosos que destruíam o prédio que ele deveria proteger. As cenas exibem subordinados do general confraternizando com vândalos. Um deles, o major José Eduardo Natale de Paula Pereira, dá uma garrafinha d'água a um invasor.

Gonçalves Dias foi inquirido nesta sexta-feira, em pleno feriado, por ordem de Alexandre de Moraes. O ministro tinha pressa. Fixara na quarta-feira, mesmo dia em que Gonçalves Dias foi exonerado da chefia do GSI, um prazo de 48 horas para a realização do interrogatório. As indagações retinem: Por que só agora? Por que os investigadores não assistiram às imagens que constavam dos autos? Por que Moraes, relator dos inquéritos, não notou que as investigações corriam sem ocorrer?

Em 12 de janeiro, quatro dias depois da intentona bolsonarista, Lula declarou que assistiria a todas as imagens, pois estava convencido de que os responsáveis pela segurança do Planalto foram coniventes com os invasores. "A porta do Planalto foi aberta para essa gente entrar", afirmou o presidente na ocasião. Na última quinta-feira, em entrevista à GloboNews, o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Paulo Pimenta, soou constrangedoramente contraditório.

Pimenta disse que as imagens assistidas por Lula não continham as cenas que escancaram a inoperância de Gonçalves Dias e a confraternização dos membros da equipe do general com os invasores. Segundo Pimenta, Lula chegou a perguntar, na semana da invasão, "sobre as imagens daquela câmera que fica voltada para a entrada da área do gabinete presidencial." Foi informado de que as filmagens não existiam. "Essas imagens ele não conhecia", sustentou Pimenta. Especulou-se que a câmera estaria quebrada. Mas essa versão foi pulverizada pelo noticiário.

Num esforço para blindar GDias, como o amigo de duas décadas de Lula é chamado, Pimenta declarou na entrevista: "Acho que o general não sabia da existência dessas imagens." Ora, o próprio Gonçalves Dias disse no depoimento à PF que entregou às instituições de Estado a íntegra do acervo de filmagens. Ou a versão de Pimenta é inverídica ou a Presidência da República virou, sob Lula, uma sucursal da Casa da Mãe Joana.

A certa altura, Pimenta declarou, em timbre categórico, que a Polícia Federal recolheu as imagens no dia 8 de janeiro. "A PF, quando chega no dia 8, faz a cópia de todas as imagens. As imagens do inquérito estão completas. Portanto, essas imagens estão no inquérito. Eu tive o cuidado de buscar essa informação. Não há nenhuma imagem que não esteja à disposição das autoridades." Ora, por que Gonçalves Dias sonegaria ao amigo Lula as cenas fornecidas à PF?

Há no Gabinete de Segurança Institucional uma sindicância aberta para apurar os indícios de conivência que até Lula havia farejado. As perguntas saltam da conjuntura como pulgas no dorso de um cão sarnento. Quer dizer que os responsáveis pela investigação interna do Planalto, assim como Lula, não assistiram às imagens que fizeram explodir a crise? Em mais de três meses de governo ninguém alertou Lula sobre a inconveniência de manter o filmado Gonçalves Dias na poltrona de ministro?

Num despacho assinado nesta sexta-feira, Alexandre de Moraes deu prazo de 48 horas para que Ricardo Capelli, ministro interino e interventor do GSI, envie ao Supremo cópia da sindicância do Planalto. Na decisão, Moraes ordenou também a Capelli que entregue à Suprema Corte, no mesmo prazo, "todo material existente" do circuito de câmeras da Presidência referente ao dia 8 de janeiro.

Ora, no dia do quebra-quebra Moraes já havia determinado à PF que recolhesse "todas as imagens das câmeras do Distrito Federal que possam auxiliar no reconhecimento facial" dos envolvidos na intentona bolsonarista. Numa evidência de que uma colônia de pulgas instalou-se no dorso de sua orelha, Moraes havia determinado à Polícia Federal, na última quarta-feira, que informasse se sua ordem foi cumprida "integralmente".

Moraes indagou especificamente se as gravações à disposição da PF incluem os trechos levados ao ar na reportagem da CNN. Perguntou também aos responsáveis pelo inquérito se foram realizados laudos periciais "e quais as providências tomadas". Por que só agora?

Exibindo uma produtividade inusual para um feriado, Alexandre de Moraes quebrou nesta sexta-feira o sigilo das imagens que registraram o quebra-quebra dentro do Planalto. Em fevereiro, ainda sob o comando do general Gonçalves Dias, o GSI havia imposto sigilo de cinco anos. Alegou que a divulgação das gravações colocaria em risco a segurança das instalações da Presidência. As mesmas instalações que ele não foi capaz de proteger em 8 de janeiro. Hoje, sabe-se o que o general queria esconder.

Moraes anotou na sua decisão que "à consagração constitucional de publicidade e transparência corresponde a obrigatoriedade de o Estado fornecer as informações necessárias à sociedade." O ministro realçou que "inexiste sigilo das imagens, com base na Lei de Acesso à Informação, sobretudo por serem absolutamente necessárias à tutela jurisdicional dos Direitos Fundamentais, ao Regime Democrático e Republicano, que foram covardemente desrespeitados no ataque criminoso à nossa Democracia, no dia 8 de janeiro de 2023".

Ricardo Capelli, o interventor do GSI, enviou para Alexandre de Moraes os nomes dos servidores pilhados nas cenas divulgadas pela CNN em flagrantes de inação ou confraternização com os invasores do Planalto. O ministro do Supremo ficou sabendo que, além do general Gonçalves Dias, aparecem nas gravações outros nove militares. São eles:

1) Major do Exército José Eduardo Natale de Paula Pereira, aquele que aparece dando água para um invasor.

2) General Carlos Feitosa Rodrigues

3) Coronel do Exército Wanderli Baptista da Silva Júnior.

4) Coronel do Exército Alexandre Santos de Amorim.

5) Coronel do Exército André Luiz Garcia Furtado.

6) Tenente-coronel do Exército Alex Marcos Barbosa Santos.

7) Tenente-coronel do Corpo de Bombeiros Marcus Vinicius Braz de Camargo.

8) Capitão do Exército Adilson Rodrigues da Silva.

9) Sargento da Aeronáutica Laércio da Costa Júnior.

De posse dos nomes, Alexandre de Moraes deu prazo de 48 horas para que a Polícia Federal interrogue todos os militares filmados no contrapé. De novo: por que só agora se a Polícia Federal já dispunha das imagens desde 8 de janeiro?

É benfazeja a tentativa de promover uma correção de rumos. Fica evidente, entretanto, que seria conveniente investigar a investigação. Não basta punir o bolsonarismo golpista. É preciso arrastar para dentro das sentenças condenatórias também os militares e servidores que contribuíram com o golpismo por incompetência ou cumplicidade.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL 

https://noticias.uol.com.br/colunas/josias-de-souza/2023/04/22/caso-das-imagens-do-planalto-expoe-falhas-da-investigacao-sobre-o-81.htm

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