Temer diante de uma encruzilhada - por Helio Gurovitz

 
A crise política deflagrada pela delação premiada do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado lança dúvidas imediatas sobre o futuro do governo do presidente interino, Michel Temer. Está em jogo não apenas o esfacelamento de seu ministério, com a queda do terceiro ministro alvejado pela Operação Lava Jato, Henrique Eduardo Alves, do Turismo. Estão em jogo também as medidas econômicas que precisam de apoio no Congresso e a sobrevivência do próprio Temer no cargo.

“Se tivesse cometido crime, não poderia presidir o país”, afirmou Temer ao negar a acusação de Machado, qualificada por ele de “irresponsável, leviana, mentirosa e criminosa”. Machado respondeu que comprovaria o encontro mantido com Temer na Base Aérea de Brasília em 2012. Na ocasião, diz Machado, Temer lhe solicitou obter doações para a campanha do então candidato à Prefeitura de São Paulo, Gabriel Chalita. MAchado afirmou que conseguiu R$ 1,5 milhão de modo ilícito para a campanha.

A Aeronáutica informou que não dispõe mais dos registros de entrada na Base Aérea. Ainda não se sabe, portanto, como Machado tentará provar o que disse. Ele disse ter chegado ao local num carro alugado da Localiza. Mas um simples registro de aluguel não basta para comprovar o encontro. Será preciso apresentar o depoimento de outras testemunhas. Será que elas existem?

Independentemente de quem esteja certo, a simples controvérsia é suficiente para aumentar as dúvidas a respeito do cenário futuro. Vários empresários voltavam a pensar em investir no país diante dos primeiros sinais de recuperação emitidos pela economia e das propostas sensatas do governo, como o estabelecimento de um teto para o crescimento dos gastos públicos. Diante das dúvidas, voltará a prevalecer a cautela.

O futuro do governo está, no fundo, nas mãos do Congresso Nacional. Duas votações de resultado ainda incerto serão centrais para defini-lo. A primeira é a própria Medida Provisória a respeito do teto de gastos. A segunda é o julgamento no processo de impeachment contra a presidente afastada Dilma Rousseff.

Ao montar seu governo, Temer privilegiou a distribuição de cargos para conquistar uma base sólida no Congresso. Até agora, não sofreu nenhuma derrota, e seus projetos foram aprovados por maiorias expressivas. Mas o teto de gastos é uma medida de natureza diferente, por interferir no interesse imediato de vários congressistas, os principais interessados nesses gastos. Eles precisarão, acima de tudo, ter confiança na permanência de Temer no poder para bancá-lo.

É aí que entra em questão a votação decisiva, a do impeachment. Cinquenta e quatro senadores são necessários para condenar Dilma. Até agora, pelas informações disponíveis, os votos declarados contrários a ela não somam 40. Há entre 20 e 25 indefinidos, número suficiente para virar a votação para um lado ou para o outro ao sabor da conveniência.

O caso mais ilustrativo é o próprio presidente do Senado, Renan Calheiros. Ele mantém uma desavença histórica com Temer no PMDB. Acabou aderindo meio a contragosto à tese do impeachment, diante da força política da denúncia. Seu principal temor é a Lava Jato. Pelas gravações de Machado, acreditava que o governo Temer seria capaz de detê-la. Não foi. Recentemente, Renan voltou a se mostrar hesitante e, na festa junina da senadora Kátia Abreu, contrária ao impeachment, chegou a dizer “sou Dilma”.

Está em curso um roteiro político cujo desfecho, a esta altura, ninguém tem condição de prever. Com exceção da economia, área para a qual indicou os melhores nomes disponíveis, Temer adotou as práticas da política tradicional para montar seu ministério. Apostou na governabilidade, no velho "tomá-lá-dá-cá" de cargos e verbas. Paga um preço alto por isso, à medida que a Lava Jato avança sobre Brasília.

O benefício teórico de sua aposta é a maioria no Congresso. Ela deveria bastar para aprovar as medidas mais que sensatas propostas por Meirelles e para afastar o espectro da volta de Dilma. Nada disso estava 100% garantido, mas era um cenário mais que provável sem as denúncias. Agora, a batalha de Temer se tornou mais dura. O país não deveria ter de escolher entre as medidas urgentes para reerguer a economia e o combate implacável à corrupção. Infelizmente, é nisso que o governo Temer parece ter se transformado.

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