STF avaliza Dino na queda de braço contra Lira por emendas: "decisões reforçam transparência"
Em nota divulgada em seu site nesta terça-feira (31), o Supremo Tribunal Federal (STF) avalizou as decisões do ministro Flávio Dino que trava uma queda de braço com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para colocar um fim definitivo no chamado "orçamento secreto", esquema criado no governo Jair Bolsonaro (PL) que turbinou a distribuição de emendas parlamentares e provocou a explosão de casos suspeitos de corrupção nas bases eleitorais.
"Decisões tomadas no final deste ano pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), confirmaram o bloqueio de parte das emendas de comissão do Congresso Nacional. As decisões integram uma série de medidas relacionadas ao tema das emendas parlamentares (instrumento por meio do qual o Legislativo atua na destinação de verbas do orçamento anual), que vem sendo discutido pela Corte desde 2022. Os posicionamentos da Corte são fundamentados na Constituição Federal, que exige que a União, os estados, os municípios e o Distrito Federal forneçam informações e dados contábeis, orçamentários e fiscais 'de forma a garantir a rastreabilidade, a comparabilidade e a publicidade dos dados coletados, os quais deverão ser divulgados em meio eletrônico de amplo acesso público'”, enfatiza a corte.
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O Supremo ainda se coloca ao lado de Dino, que barrou uma carta-resposta vazia feita pela Advocacia da Câmara, a pedido de Lira, para explicar a mais recente manobra, que buscava distribuir R$ 4,2 bilhões das chamadas emendas de comissões apenas com o aval das lideranças partidárias.
Desse total, mais de R$ 300 milhões seriam destinados a Alagoas, estado natal de Lira, e contemplava, entre outros, uma série de construção de campos de futebol Society - levantamento suspeita assim como foi feito o esquema investigado pela Polícia Federal com os kits robótica.
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"Com base em relatórios da Controladoria-Geral da União (CGU), o STF verificou o descumprimento dessas exigências constitucionais na execução de diferentes modalidades de emendas parlamentares? – incluindo individuais, de relator, de bancadas estaduais e de comissão. Entre 2019 e 2024, foram pagos R$ 186,3 bilhões sem que houvesse clareza sobre a origem e o destino dos recursos", diz o texto, que elenca, ponto a ponto, a queda de braço de Dino com Lira - veja ao final da reportagem.
Verbas para a saúde
Horas antes da divulgação da nota, Dino autorizou o empenho das chamadas "emendas de comissão" para garantir o cumprimento do piso constitucional de gastos mínimos em saúde pelo governo federal em 2024. A medida busca assegurar que 15% da Receita Corrente Líquida seja destinada ao setor, como prevê a Constituição.
A Advocacia-Geral da União (AGU) apontou a necessidade de um aporte adicional de R$ 2,1 bilhões para atingir o piso constitucional, dos quais R$ 370 milhões são provenientes de emendas de comissões.
Dino destacou, entretanto, a fragmentação e a falta de planejamento dessas emendas, que frequentemente ignoram indicadores sanitários e podem estar sujeitas a irregularidades.
"Esse fato mostra uma preocupante dependência de gastos vinculados a emendas parlamentares [...], sem levar em conta indicadores sanitários objetivos, além dos terríveis casos de improbidade já identificados ou em investigação", afirmou o ministro.
Identificação obrigatória de autores
Na decisão, Dino determinou que as comissões de Saúde da Câmara dos Deputados e do Senado Federal informem até 31 de março de 2025 os nomes dos parlamentares responsáveis pelas emendas. Caso o prazo não seja cumprido, as emendas poderão ser anuladas automaticamente.
Até que os autores sejam identificados, Dino suspendeu a execução dos valores, permitindo apenas o empenho. Segundo ele, a medida visa garantir eficiência, transparência e rastreabilidade no uso dos recursos.
"Sem planejamento, conjugado com adequada vontade política e administrativa, a balbúrdia orçamentária – violadora da Constituição Federal – não terá fim", destacou o ministro.
Nulidade de ofícios e impacto financeiro
Dino também declarou nulos os ofícios que indicavam emendas das comissões da Câmara, no valor de R$ 4,2 bilhões, e do Senado, de R$ 2,7 bilhões, independentemente da data de empenho.
Até 23 de dezembro, a Secretaria de Relações Institucionais (SRI) registrava o empenho de R$ 1,775 bilhão em emendas da Câmara. Contudo, um total de R$ 6,893 bilhões segue empenhado em emendas de comissão apenas na Câmara dos Deputados. Os valores referentes ao Senado e ao Congresso Nacional não foram detalhados.
Veja o passo a passo, descrito pelo STF, do embate entre Dino e Lira em torno das emendas parlamentares.
19/12/2022 – Inconstitucionalidade do “orçamento secreto”
No julgamento das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 850, 851, 854 e 1014, o Plenário considerou inconstitucional o chamado “orçamento secreto”. Os processos questionavam o uso indevido das emendas de relator do Orçamento da União (identificadas pela sigla RP-9) para incluir novas despesas públicas ou programações no projeto de lei orçamentária anual da União. A decisão seguiu o voto da relatora, ministra Rosa Weber (aposentada), para quem essa modalidade de emenda (anônima, sem identificação do proponente e clareza sobre o destinatário) viola os princípios constitucionais da transparência, da impessoalidade, da moralidade e da publicidade.
“Não é razoável supor que emendas parlamentares sejam alocadas a partir de dezenas de ofícios, sem que sejam assegurados dados abertos em sistema de registro centralizado que permitam a transparência ativa, a comparabilidade e a rastreabilidade por qualquer cidadão e órgãos de controle”, afirmou a ministra.
Na ocasião, o ministro Luís Roberto Barroso destacou que “em uma democracia e em uma república não existe alocação de recurso público sem a clara indicação de onde provém a proposta, de onde chega o dinheiro”.
Também no julgamento, o decano da Corte, ministro Gilmar Mendes, lembrou que os princípios constitucionais da publicidade e da transparência devem ser observados em todas as fases do ciclo orçamentário, e não apenas na de execução.
17/6/2024 – Audiência de conciliação
Entidades que participaram do julgamento das ADPFs na condição de terceiros interessados (amici curiae) comunicaram ao STF a persistência do descumprimento da decisão da Corte, e o ministro Flávio Dino, sucessor da ministra Rosa Weber, marcou audiência de conciliação com representantes dos Poderes Legislativo e Executivo, da Procuradoria-Geral da República e do Tribunal de Contas da União para tratar da questão.
1/8/2024 – Destinação das emendas e prazo para informações
Após a audiência de conciliação, o ministro Flávio Dino decidiu que parlamentares só poderão destinar emendas para o estado (ou para município integrante do estado) pelo qual foi eleito, salvo projeto de âmbito nacional, e deu prazo de 30 dias para o Executivo e o Legislativo complementarem informações. Em 90 dias, a Controladoria-Geral da União (CGU) também deveria apresentar uma auditoria em todos os repasses parlamentares. Também foram designadas reuniões técnicas para detalhamento das informações e procedimentos necessários ao cumprimento integral da decisão do STF.
1/8/2024 – Transparência nas emendas Pix
Atendendo a pedido na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7688, apresentada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o ministro Flávio Dino determinou que as chamadas “emendas Pix” (emendas individuais que permitem a transferência direta de recursos) somente podem ser liberadas com o atendimento aos requisitos constitucionais da transparência e da rastreabilidade e com a fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) e da CGU. Essa decisão foi referendada pelo Plenário.
8/8/2024 – Reforço nas regras de transparência
Em decisão liminar na ADI 7695, proposta pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o ministro Flávio Dino reafirmou a exigência de transparência para as emendas Pix. No entanto, autorizou sua execução em casos de obras em andamento ou situações de calamidade pública reconhecidas pela Defesa Civil.
14/8/2024 – Suspensão de emendas impositivas
Em liminar deferida na ADI 7697, o ministro Flávio Dino suspendeu todas as emendas impositivas de deputados federais e senadores ao orçamento da União. “Não é compatível com a Constituição Federal a execução de emendas ao orçamento que não obedeçam a critérios técnicos de eficiência, transparência e rastreabilidade, de modo que fica impedida qualquer interpretação que confira caráter absoluto à impositividade de emendas parlamentares”, destacou. Ficaram ressalvados, no entanto, os recursos destinados a obras já iniciadas e em andamento ou a ações para atendimento de calamidade pública formalmente declarada e reconhecida.
16/8/2024 – STF mantém suspensão de emendas impositivas
Em sessão virtual extraordinária, o Plenário manteve, por unanimidade, a suspensão das emendas impositivas e as exigências de transparência nas “emendas Pix”. Na mesma data, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, rejeitou um pedido do Congresso Nacional para retomar a execução das emendas. Barroso explicou que a intervenção da Presidência contra a decisão de outro ministro do Tribunal é excepcionalíssima e que as decisões do ministro Dino já estavam em discussão no Plenário.
23/8/2024 – Atualizações no Portal da Transparência
O ministro Flávio Dino determinou novas medidas para aperfeiçoar a execução das emendas. A decisão foi dada após diálogo institucional com os demais Poderes e reuniões técnicas sobre a melhor forma de garantir transparência e rastreabilidade no repasse dos valores.
Por ordem do ministro, a CGU deverá apresentar uma proposta de reestruturação do Portal da Transparência que permita a apresentação simplificada e de fácil acesso das informações referentes às emendas de comissão (RP 8) e de relator (RP 9). Se a informação não estiver disponível, a CGU deverá apresentar essa necessidade para que sejam adotadas requisições judiciais ou providências para responsabilizar agentes omissos.
2/12/2024 – Liberação condicionada
Após a análise de petições e das medidas adotadas pelos Poderes Legislativo e Executivo para a continuidade da execução das emendas parlamentares, Flávio Dino autorizou o pagamento de emendas RP8 (comissão), RP9 (relator) e Pix, condicionado ao cumprimento das exigências constitucionais de transparência, rastreabilidade e controle público. Na decisão, o ministro definiu uma série de critérios, como a indicação do autor e do beneficiário final dos recursos no Portal da Transparência, além da separação entre o relator do orçamento e o autor das emendas. Determinou também que o Executivo verifique caso a caso a transparência antes de transferir os recursos. Nas emendas Pix, exigiu que, a partir de 2025, elas somente sejam liberadas com a apresentação prévia de um plano de trabalho e em contas específicas. Essa decisão foi referendada por unanimidade pelo Plenário em sessão extraordinária virtual.
23/12/2024 – Bloqueio de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão
O ministro suspendeu o pagamento de 5.449 emendas de comissão, totalizando R$ 4,2 bilhões, até que sejam apresentados documentos que comprovem a regularidade das destinações. Por meio de manifestação apresentada ao STF, partidos políticos e entidades apontaram irregularidades na tramitação das emendas nas comissões permanentes e denunciaram suspeita de “apadrinhamento” por líderes partidários.
29/12/2024 – Bloqueio definitivo com exceções
Após receber informações da Câmara dos Deputados, Flávio Dino manteve o bloqueio das emendas de comissão consideradas irregulares, permitindo, excepcionalmente, a execução de empenhos realizados antes de 23 de dezembro para evitar insegurança jurídica. “Não se trata de interferência judicial na sagrada autonomia do Poder Legislativo, e sim de sua adequação à Constituição e às leis nacionais. Este é um dever irrenunciável do STF: assegurar que não haja o império de vontades individuais ou a imposição de práticas concernentes ao constitucionalismo abusivo, de índole autoritária e apartada do interesse público”, reforçou.
30/12/2024 – Emendas do Senado
O relator também manteve o bloqueio das emendas de comissão feitas pelo Senado Federal, ressalvando aquelas que tenham tido reserva de recuso (empenho) até o dia 23 deste mês.
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