Bolsonaro turbina Auxílio Brasil, mas reduz outros programas sociais

 Thiago Resende

Governo destina menos verba para ações de saúde, educação e moradia voltadas a mais pobres


Brasília

De olho na campanha à reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) turbina o Auxílio Brasil, mas o governo acumula resultados negativos em outros programas sociais.

A verba para habitação, saúde e educação da população mais pobre tem passado por sucessivos cortes ao longo da gestão bolsonarista.

Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Planalto para lançar medidas voltadas ao empreendedorismo - Sergio Lima - 25.mai.2022/AFP

Marcas petistas, como o Farmácia Popular e o Fies, registram queda no orçamento desde que Bolsonaro assumiu o mandato. 

Até o programa Casa Verde e Amarela –vitrine criada por ele na construção de moradias– não foi poupado.

A redução nos recursos para esses projetos na área social tem consequências. 

O número de casas entregues nos anos Bolsonaro recua. 

A quantidade de farmácias credenciadas para atender a população de baixa renda também caiu.

A exceção é o programa de transferência de renda, o Auxílio Brasil, criado no ano passado para dar a Bolsonaro um legado social e substituir a forte marca petista do Bolsa Família.

Numa coalizão entre a equipe econômica e a ala política do governo, o Auxílio Brasil foi desenhado para quebrar recordes de famílias atendidas e valores transferidos, mesmo que isso exija driblar regras de controle de gasto público.

Em mais um desses acordos, o governo espera aprovar nesta semana uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que cria novos benefícios sociais, apesar das limitações legais em ano eleitoral, além de ampliar o valor do Auxílio Brasil para R$ 600 e zerar a fila de espera do programa.

Enquanto isso, a principal iniciativa nos últimos anos para tentar reduzir o déficit habitacional no país enfrenta um cenário bem diferente. 

O Casa Verde e Amarela tem um orçamento de R$ 1,2 bilhão neste ano –o menor da história.

De 2009 a 2018, a média destinada ao antecessor do programa habitacional (Minha Casa, Minha Vida) se aproximava de R$ 12 bilhões por ano.

No primeiro ano do governo Bolsonaro, o presidente recebeu um Orçamento prevendo R$ 5 bilhões para esses projetos voltados à moradia para população de baixa renda.

Com o aperto na verba, menos unidades habitacionais são contratadas para serem construídas.

 São cerca de 350 mil por ano sob Bolsonaro. 

Entre 2014 (quando a situação das contas públicas se agravou) até 2018, foram 438 mil por ano, em média.

Entenda as medidas propostas na PEC que turbina gastos sociais

Em relação às casas entregues, são 410 mil por ano no atual governo. 

Entre a reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e o período de Michel Temer, a média foi de 544 mil por ano.

"Em razão do cenário de restrição orçamentária, o programa Casa Verde e Amarela foi impactado, assim como outros programas do governo", afirma o Ministério do Desenvolvimento Regional, responsável por gerir essa área.

A pasta diz, então, que passou a priorizar a conclusão de obras que estavam paralisadas –das 180 mil unidades habitacionais que estavam paradas, 130 mil foram retomadas. Além disso, promoveu um corte nos juros do programa para o menor patamar da história.

A marca de Bolsonaro na área habitacional, porém, acabou com a faixa do Minha Casa, Minha Vida que atendia as famílias de renda mais baixa e que poderiam assinar contratos com subsídio de até 90% do valor do imóvel, sem juros.

Para Sérgio Praça, professor e pesquisador da Escola de Ciências Sociais da FGV, o presidente Bolsonaro prioriza o programa Auxílio Brasil por ser um gasto social capaz de gerar dividendos eleitorais de forma mais imediata.

"Ele [Bolsonaro] é a cara do Auxílio Brasil, a cara desse aumento [no benefício].

 Assim, ele consegue tomar crédito político alto por isso. Manter o orçamento de outros programas [sociais] seria ótimo para a população, mas isso tem menos impacto na campanha política", disse o professor.

Com a PEC e as expansões anteriores no programa de transferência de renda, o presidente, segundo Praça, tenta cristalizar o cenário de que a corrida ao Palácio do Planalto seguirá para o segundo turno –apesar da vantagem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas pesquisas de intenção de voto.

Criado para distribuir remédios gratuitos ou com descontos à população de baixa renda, o programa Farmácia Popular foi reduzido na gestão de Bolsonaro.

Auxílio Brasil em Curralinho (PA)
  • Desde 2020, primeiro ano da pandemia, são cerca de 20 milhões de beneficiários no programa. Isso representa 1,2 milhão a menos que no ano anterior. A cobertura já foi de 22,8 milhões sob Temer.

O Farmácia Popular distribui medicamentos básicos gratuitamente para hipertensão, diabetes e asma por meio de farmácias privadas conveniadas. Remédios para controle de rinite, mal de Parkinson, osteoporose e glaucoma, além de anticoncepcionais, são vendidos com desconto de até 90%.

A quantidade de farmácias também caiu para cerca de 30 mil unidades. No início do atual governo, eram 31 mil. Em 2015, auge da rede de atendimento, havia 34,6 mil farmácias.

O Ministério da Saúde diz que "não houve redução no orçamento do programa, considerando os valores previstos na LOA [ou seja, no Orçamento]",

No entanto, por causa da inflação, a redução na verba chega a quase 25% na comparação com 2018. Os recursos, corrigidos pela inflação, recuaram de R$ 3,2 bilhões para R$ 2,4 bilhões (valor previsto para esse ano de eleição).

A pasta da Saúde reforça que o programa tem o objetivo de complementar a distribuição de medicamentos, cujo principal acesso é pelas Unidades Básicas de Saúde ou farmácias municipais.

Na área educacional, o Fies –programa para estimular o acesso da população de baixa renda ao Ensino Superior– também perdeu espaço. O orçamento dessa iniciativa foi reduzido de R$ 22 bilhões em 2018 para R$ 5,5 bilhões neste ano.

Procurado, o Ministério da Educação não se manifestou sobre o corte.

Técnicos dizem que o Fies cresceu de forma desordenada sob Dilma e, por causa da crise nas contas públicas, regras mais rígidas para a concessão de financiamentos foram adotadas no governo Temer. O objetivo é reduzir a inadimplência.

No programa, parte das mensalidades de estudantes em universidades privadas são pagas pelo governo. Em troca, os beneficiários precisam quitar o financiamento após a formatura.

Desde 2020, o número de contratos assinados tem sido praticamente a metade da quantidade de vagas oferecidas.

Principais programas sociais do governo

Auxílio Brasil

  • Como funciona? Beneficiário recebe valor mensal para superar a faixa de pobreza ou extrema pobreza
  • O que tem acontecido no governo Bolsonaro? Programa substituiu o Bolsa Família e, desde que foi criado, tem sido priorizado. É a aposta da ala política para alavancar campanha à reeleição. Número de famílias atendidas e o valor transferido têm batido recordes e devem registrar novas marcas após a PEC que libera bilhões para benefícios sociais.

Casa Verde e Amarela

  • Como funciona? Financiamento com juros reduzidos para construção de moradias, especialmente para população de baixa renda
  • O que tem acontecido no governo Bolsonaro? Programa substituiu o Minha Casa, Minha Vida. Mas verba tem sido reduzida nos últimos anos e é a menor da história em 2022. Número de unidades contratadas e entregues caiu na atual gestão, apesar do corte nas taxas de juros.

Farmácia Popular

  • Como funciona? Distribui medicamentos básicos gratuitamente para hipertensão, diabetes e asma por meio de farmácias privadas conveniadas. Remédios para controle de rinite, mal de Parkinson, osteoporose e glaucoma, além de anticoncepcionais, são vendidos com desconto
  • O que tem acontecido no governo Bolsonaro? Verba do programa não é corrigida pela inflação desde o início da atual gestão. Com isso, orçamento tem perda de 25% nos últimos anos. Número de beneficiados pelos medicamentos e número de farmácias caiu

Fies

  • O que é? Programa de concessão de financiamento a alunos de ensino superior
  • Como funciona? Governo paga parte de mensalidades e aluno quita o financiamento após formatura
  • O que tem acontecido no governo Bolsonaro? 
Orçamento do programa foi drasticamente reduzido nos últimos anos por causa de regras mais rígidas para concessão dos financiamentos
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2022/07/bolsonaro-turbina-auxilio-brasil-mas-reduz-outros-programas-sociais.shtml

Postagens mais visitadas deste blog