Admiradores e estudiosos de Mogi buscam reconhecimento da obra e vida do pintor chinês Chang Dai-Chen

Artista se estabeleceu em Taiaçupeba, em Mogi das Cruzes, e possui reconhecimento mundial, com obras em museus e galerias de arte ao redor do mundo. Pintor é uma das principais personagens das artes na história de Mogi das Cruzes.


Por João Belarmino e Caynan Ferreira, Diário TV 1ª Edição

Artista Chang Dai-Chien faz parte da história artística de Mogi das Cruzes

Artista Chang Dai-Chien faz parte da história artística de Mogi das Cruzes

Mogi das Cruzes é também Mogi das histórias. Uma delas é a de um artista chinês que viveu em Taiaçupeba. Ele é dono de obras importantes, mas sua passagem pelo município está esquecida sob as águas da represa do Rio Jundiaí.

Desde 1976, ano de inauguração da represa, essa é a paisagem aqui em Taiaçupeba. Mas o que pouca gente sabe, é aqui, submersa, está uma história de relação da nossa região com o outro lado do mundo. Mas debaixo dessas águas está apenas uma parte dela. O ponto inicial fica a alguns quilômetros de distância.

Hoje, com essa Mogi tão diferente, de séculos atrás, as histórias muitas vezes são contadas através de lembranças, coisa que o Francisco Ornellas tem de sobra. O jornalista conviveu com Chang Dai-Chien, artista considerado o “Picasso chinês”.

"Meu primeiro contato com o Chang foi por volta de 1955, 1956, quando ele chegou a Mogi Meu pai me levou conhecer, eu tinha sete, oito anos, e meu pai levou conhecer sua casa que seria ocupada. Foi a primeira casa aqui que ele e a família ocuparam em Mogi. Na verdade era uma chácara na Rua Santana, quase esquina com a Rua Ipiranga, perto ali perto do Hospital Ipiranga. E me impressionou a coleção de macacos dele, era uma meia dúzia ou oito macacos bugios que habitavam o quintal da chácara, que depois foi delegacia seccional de Polícia [Civil] em Mogi", disse o jornalista.

Uma figura que despertava a curiosidade de Francisco. Ele conta que o artista chinês costuma caminhar pela cidade acompanhado de seus macacos e também de suas várias esposas. Chang se tornou uma personalidade e foi isso que o fez parar em um programa de televisão.

"Havia um programa de televisão, uma gincana. Na verdade era uma gincana entre duas cidades, e Mogi foi sorteada pra disputar com Campinas. Imagina, Mogi das Cruzes, de 1967, uma província de 160 mil habitantes, disputando uma gincana metrópole de Campinas. Pois é, e lá fomos nós. Entre as missões que couberam às cidades, havia uma que impunha que se levasse ao programa cidade contra a cidade, uma personalidade ou o que tivesse nascido ou que tivesse morado ou que morasse na cidade. Campinas levou o arcebispo de São Paulo, cardeal, que era campineiro de nascimento. E nós levamos mestre Chang. Foi um foi um acontecimento. Mogi ganhou de Campinas por 22 a 16. E o prêmio era uma ambulância para a Santa Casa. Então, Mogi ganhou uma ambulância pra Santa Casa".

O artista queria um lugar de paz. Em meados dos anos 50, escolheu o distrito de Taiaçupeba como um refúgio, ou melhor, um ateliê onde a paisagem foi uma de suas maiores inspirações.

"Mogi tem um clima parecido com a terra natal dele, a província de Sichuan. Então, ele acabou se identificando com isso, com as montanhas também, a Serra do Itapeti, a Serra do Mar, uma região circundada por montanhas. Então, tudo isso inspirou a querer ficar aqui. O fato de ter uma colônia japonesa grande também foi uma coisa importante, porque ele tinha afinidade, ele morou no Japão um tempo também, no início da carreira dele. Ele tinha afinidade com a cultura japonesa, e também tinha uma colônia chinesa pequena aqui nos anos 1950, que ele acabou até atraindo mais pessoas, mais cidadãos chineses pra Mogi das Cruzes nessa época", contou o jornalista e escritor, Guilherme Gorgulho Braz.

Há mais de 20 anos, Guilherme se dedica à pesquisa sobre Chang e à arte chinesa no Brasil. O primeiro contato foi na faculdade de jornalismo, em 1996. Na época, ele começou a produzir reportagens sobre o artista, reunindo materiais sobre a vida de Chang no Brasil e em outros países, como a Argentina. A fascinação é tanta que Guilherme chegou a fazer intercâmbio cultural.

Todo esse portfólio rendeu uma certa autoridade. Chegou a ser convidado para dar palestras na China e agora, junto com uma diretora chinesa erradicada nos Estados Unidos, está envolvido em um documentário sobre a vida de Chang.

"Esse documentário também está sendo feito há mais de dez anos. E percorreu vários lugares pelos quais o Chang viveu, desde a China, Brasil, Argentina, Estados Unidos. Mas o foco principal dele acabou sendo o Brasil. Então, é um documentário, uma produção norte-americana, mas a vida do Chang no Brasil foi tão importante pra essa história que acabou ganhando um peso maior e compõe a parte principal desse documentário que deve ser lançado agora em novembro no Brasil", disse Gorgulho.

Nesse período em Taiaçupeba, Chang teve o que é considerado por muitos críticos como uma de suas fases mais importantes, mas pouco conhecida pela China, em que suas obras vêm sendo cada vez mais valorizadas. E junto às águas da represa, em meio a ruínas, ainda restam vestígios de um grande patrimônio deixado pelo artista: o Jardim das Oito Virtudes.

"Em outubro de 2020, eu, nas caminhadas aí que eu fazia, acabei encontrando a trilha. E aí eu dei sorte de nesse dia a represa estar bem baixa e eu conseguir caminhar pelo jardim, pelas ruínas e conhecendo. Foi uma mistura de emoção assim, de felicidade com tristeza ao mesmo tempo, porque ver as ruínas, do jeito que foi tratado, a história dele sendo abafada me entristeceu bastante e eu me senti na obrigação de fazer alguma coisa", explicou o escultor Fabiano Spike.

Essa admiração de Fabiano não é para menos. O Jardim das Oito Virtudes, em Taiaçupeba, era imenso e reunia toda a dedicação do artista que via o espaço como um ferramenta de criatividade, além da Mata Atlântica, que sempre aparecia em suas obras. Mas este projeto acabou sendo abreviado pela criação da represa no distrito.

“A construção da represa ela não dizimou apenas o jardim das oito virtudes, mas ela dizimou a economia do distrito. Ela acabou, a gente era um polo produtor agrícola. E após a inundação da represa, eles terem construído a represa, a gente perdeu a economia e a cultura. o maior jardim oriental do brasil, que eu considero, acabou se perdendo“.

O admirador de Chang vem, há algum tempo ,desenvolvendo uma escultura que pesa mais de uma tonelada, como forma de resgatar essa história e fazer com que ela seja conhecida por gerações futuras.

“Então eu decidi fazer uma escultura de quatro metros no concreto. primeira vez que eu estou fazendo nesse material. trabalhava com isopor, com outros materiais antes. Estou fazendo uma escultura pequena também, que é pra presentear algumas autoridades, e um documentário que vai contar a trajetória dele em Taiaçupeba, em especial”.

Um artista com obras avaliadas em milhões de dólares. Para muitos, Chang foi um cometa que iluminou o céu da região mas que ainda não possui o devido reconhecimento.

“Nós perdemos essa memória. uma coisa importante dizer é que Mogi esqueceu desse personagem como se esqueceu de outros personagens importantes, como o próprio Alfredo Volpi, que é um pintor importantíssimo para o brasil, e que nada recorda em Mogi que o Alfredo Volpi, ou quase nada, viveu aqui”, disse Gorgulho.

“A história do mestre Chang é incrível. Eu eu lamento Mogi das Cruzes não dar o devido valor", lamentou Ornellas. 

https://g1.globo.com/sp/mogi-das-cruzes-suzano/noticia/2023/09/01/admiradores-e-estudiosos-de-mogi-buscam-reconhecimento-da-obra-e-vida-do-pintor-chines-chang-dai-chen.ghtml

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