Troca de mensagens pode complicar a vida de Joesley Batista e anular a sua delação

Uma troca de mensagens entre o ex-procurador da República Marcello Miller e a advogada Esther Flesch, a que O Antagonista teve acesso, pode dar novo fôlego ao pedido da PGR de anulação da delação dos executivos da JBS pelo Supremo Tribunal Federal. 
Por Pedro Canário

O tribunal deve julgar no segundo semestre o pedido da PGR de anulação da delação de Joesley, Wesley Batista, donos da JBS, e o executivo do grupo, Francisco de Assis. 

O pedido partiu de Rodrigo Janot, então Procurador-Geral da República, que diz que os delatores omitiram crimes. 

Uma dessas omissões seria a participação indevida do ex-procurador Marcello Miller no processo de negociação da delação.

Na manifestação final do pedido, encaminhada ao STF por Augusto Aras, o atual PGR, escreveu:

“A conduta de cooptar um Procurador da República (Marcello Miller), recém-egresso da equipe da equipe da Lava Jato na PGR, com o objetivo de usá-lo como meio de acesso aos responsáveis pelas negociações da colaboração premiada em curso, ostenta gravidade notória. 

Ela demonstra que Joesley Batista, Wesley Batista, Ricardo Saud, Francisco de Assis e Silva, em pleno processo de negociação e celebração dos respectivos acordos de colaboração premiada, ao invés de adentrarem um espaço de conscientização e redenção pela prática de incontáveis delitos ao longo de suas vidas, escolheram fazer mais do mesmo: continuarem delinquindo, desta vez se valendo de um membro do próprio Ministério Público.”

A troca de mensagens entre Miller e Esther reforçaria a tese da PGR.
No dia 8 de maio de 2017, Marcello Miller estava começando a trabalhar para o escritório Trench, Rossi e Watanabe e enviou a Esther Flesch, na época sócia da banca, um registro das horas que havia dedicado ao caso da JBS. Entre as horas, estava uma reunião do dia 19 de abril de 2017 com o procurador da República Eduardo Pelella, na época chefe de gabinete de Rodrigo Janot, então procurador-geral da República. No entanto, como Miller havia trabalhado diretamente com Janot, ele poderia estar numa situação de conflito de interesses ao se reunir com ex-colegas da PGR para discutir a delação – em nota, Miller explicou que sua quarentena só se aplicava ao Rio de Janeiro, último lugar que trabalhou como procurador da República.
A JBS nega irregularidades. Ao STF, disse que Miller atuava como advogado contratado pelo Trench, Rossi e Watanabe, escritório responsável pela leniência, não pela delação – e a leniência não passou pela PGR, ficou com o MPF em primeira instância.
Na prestação de contas enviada a Esther Flesch em 8 maio de 2017, contudo, Miller escreveu: “Interlocução Eduardo Pelella (JBS)”. A mensagem indicaria que o ex-procurador trabalhou na delação dos executivos da JBS, e não apenas no acordo de leniência.
Em 19 de abril, quando se reuniu com Pelella, Miller já não estava mais no MPF. Sua exoneração foi publicada em Diário Oficial no dia 5 de abril daquele ano.
Abaixo, a mensagem enviada por Miller a Esther Flesch. A reunião com Pelella está no último bloco de datas, ao final da imagem:


O advogado da JBS no Supremo, André Callegari, nega que Miller tenha trabalhado na delação. Segundo Callegari disse a O Antagonista, a reunião entre Miller e Pelella foi para “estabelecer um ponto de contato para a leniência”. 

O encontro “não foi com Pelella especificamente”, afirma o advogado – havia outros procuradores e advogados presentes. A anotação de Miller na prestação de contas ao escritório era “apenas uma referência”, segundo Callegari.

Pelella também negou ter discutido a delação com Miller. Em depoimento ao Supremo, em março do ano passado, disse nunca ter conversado com o ex-colega sobre “possíveis benefícios aos colaboradores”.

Miller não falou com a reportagem. Mas, segundo O Antagonista apurou, a reunião do dia 19 de abril de 2017 foi a conclusão de uma conversa que havia começado na semana anterior, numa primeira reunião. Naquela ocasião, a delação dos executivos da JBS já estava concluída, mas as negociações da leniência nem sequer tinham começado. Seria, de fato, atípico para a Lava Jato discutir em conjunto delação e leniência.

Miller teria ido à PGR para saber com quem negociaria os termos da leniência, já que a JBS era alvo de três investigações grandes. Além da Lava Jato, também havia inquéritos abertos nas operações Greenfield e Bullish, cada uma de responsabilidade de um procurador diferente.

Na primeira reunião, Pelella e os demais procuradores presentes (entre eles, Sergio Bruno, que vinha capitaneando as negociações com os delatores da Lava Jato) teriam ficado de perguntar à 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF quem deveria negociar a leniência com Miller. A reunião do dia 19 de abril, portanto, teria sido para comunicar que a mesa escolhida fora a da Operação Greenfield.

O relator do pedido de anulação da delação é o ministro Luiz Edson Fachin. O voto dele já está pronto desde setembro do ano passado, mas o processo vem sendo adiado repetidamente por diversos motivos – a última vez foi o alongamento do julgamento sobre o inquérito das fake news.

Em resposta à reportagem, o Grupo J&F, dono da JBS, enviou a seguinte nota:

O documento apresentado por O Antagonista foi juntado ao inquérito pela própria defesa, corroborando que o envolvimento de Marcelo Miller se deu unicamente no acordo de leniência da J&F, para o qual o escritório em que trabalhava foi contratado. A referida reunião nunca foi negada ou omitida pelos colaboradores.

O fato é que Miller nunca tratou dos acordos de colaboração do grupo, o que ficou comprovado por depoimentos de membros da própria PGR e por decisão colegiada do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que trancou a ação penal sobre o caso por não enxergar fato a ser analisado na conduta de Miller.

Essa troca de mensagens foi noticiada em 2018, inclusive pelo próprio O Antagonista. Não há nela nenhum fato novo nem para a Procuradoria-Geral da República (PGR), nem para o Supremo Tribunal Federal.

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