Planos econômicos: advogados fazem contas e questionam se acordo é vantajoso para poupadores

Profissionais ouvidos pelo G1 criticam a redução do valor a ser recebido pelos poupadores, mas apontam que possibilidade de finalizar questão e receber valores pode motivar adesões. 

 Por Karina Trevizan, Luisa Melo e Marta Cavallini, G1


Advogados especializados na área estão fazendo as contas para avaliar se vale a pena para seus clientes aderir ao acordo entre bancos e poupadores prejudicados por planos econômicos dos anos 1980 e 1990 . Entre os profissionais ouvidos pelo G1, a principal crítica é a forte redução do montante que será pago às pessoas que aderiram ao acordo.


No entanto, Marilena Lazzarini, presidente do conselho diretor do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), discorda que o acordo seja tão prejudicial aos poupadores. O Idec propôs diversas ações coletivas sobre o tema, e participou das negociações que resultaram no acordo. "A maioria dos processos está parada. As pessoas não estão recebendo. O acordo é uma maneira que as pessoas têm de conseguir pelo menos uma parte do dinheiro", defende ela.


O acordo foi fechado nesta semana entre representantes do governo, de bancos e de poupadores prejudicados pelos planos Bresser (1987), Verão (1989) e Collor II (1991). Ele determina que os valores devidos aos clientes que entrarem no acordo serão recalculados, sofrendo assim uma redução. Para quem tiver mais de R$ 5 mil a receber, haverá parcelamento. Os bancos terão até três anos para pagar.


Veja aqui mais detalhes sobre o acordo entre bancos e poupadores

O advogado Alexandre Berthe aponta que a redução no montante a ser recebido por seus clientes é drástica e, por isso, o acordo não pode ser considerado vantajoso. Ele, porém, ressalva que o fator
O advogado Alexandre Berthe aponta que a redução no montante a ser recebido por seus clientes é drástica e, por isso, o acordo não pode ser considerado vantajoso. Ele, porém, ressalva que o fator "tempo" pode influenciar decisões (Foto: Fábio Tito/G1)

Essas condições foram alvo de muitas críticas entre advogados especializados no assunto. Um deles é Alexandre Berthe, que tem diversos casos sobre planos econômicos e considerou os termos do acordo “um absurdo”, especialmente no que se refere ao cálculo da correção monetária.


Isso porque os índices utilizados para corrigir o valor que poupadores teriam para receber resulta em montantes muito menores que as simulações feitas sob os critérios dos tribunais de Justiça estaduais.



Berthe cita o exemplo de um cliente que, pela correção monetária feita pelo sistema do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), teria cerca de R$ 5,9 mil para receber por perdas referentes ao Plano Bresser. Pela correção proposta no acordo, o advogado calcula que o montante cairia para R$ 1,2 mil.

“Eu respeito as opiniões contrárias, mas, para mim, é assustador que alguém tenha considerado isso um bom acordo. A orientação que vou dar aos meus clientes é não aderir”, conta Berthe.


Ele, no entanto, ressalva que essa avaliação leva em conta apenas as perdas monetárias, mas há ainda a questão subjetiva em torno do tempo de espera para receber o dinheiro.


O advogado das áreas bancária e trabalhista César Aguiar também calcula as perdas para os poupadores, e considera que o acordo é prejudicial para eles. “Fazendo uma simulação, se o poupador tinha 1 mil cruzeiros, pelo acordo ele vai receber R$ 4 mil. Mas levando em conta o que consta nos processos, pelos nossos cálculos, os mesmos 1 mil cruzeiros perfariam R$ 20 mil hoje”, explica.

“O problema é que existem casos de clientes com extrema necessidade, inclusive de saúde, que deverão aceitar o acordo”, diz Aguiar.


O também advogado Roberto Ayusso Filho diz que vai recomendar a seus clientes que não aceitem o acordo. Junto com escritórios parceiros, ele cuida de cerca de 1,2 mil poupadores.

"Os bancos estão jogando com o desespero da população. Estamos numa crise, tem gente tão enforcada que vai aceitar qualquer coisa", diz Ayusso Filho.


No entanto, Marilena Lazzarini, do Idec, defende que o acordo é uma saída para aqueles que estão há muito tempo na espera e não têm perspectiva de receber o dinheiro no curto prazo.

"É um acordo bom? Não. É um acordo possível", argumenta Lazzarini.


Walter Moura, advogado do Idec em Brasília, diz que está “convicto” em relação ao acordo. “Estou reduzindo a contingência no que o banco pode pagar e no que o poupador poderia receber, mas estou reduzindo esse impacto de risco (de o pagamento nunca chegar)”.



Indecisão: aceitar ou esperar?




O engenheiro eletrônico Roberto Su Kataoka teria quase R$ 6 mil para receber, mas, se aceitar o acordo, calcula que irá ganhar cerca de R$ 1,2 mil. 'Eu sei que não é vantajoso', diz (Foto: Arquivo pessoal)




O engenheiro eletrônico Roberto Su Kataoka, de 42 anos, ainda não decidiu se irá aceitar a proposta para o pagamento das perdas dos planos econômicos das décadas de 1980 e 1990. Pela correção proposta no acordo, seu advogado calcula que o montante que ele tem a receber cairia de quase R$ 6 mil para R$ 1,2 mil. Se não aceitar, ele terá de esperar pelo andamento do processo, sem previsão de um desfecho.

“Eu sei que não é vantajoso, mas ainda não decidi nada. Vou analisar o assunto”, diz o engenheiro.


Seus pais também têm dinheiro a receber, bem mais que ele, mas, como ele, não decidiram ainda. “Eles estão animados, querem usar o dinheiro para viajar e comprar”, conta o filho.


Kataoka e seus pais já conseguiram ganhar na Justiça, em 2007, a causa pelas perdas do Plano Verão. “Mas no meu caso foi pouco porque era uma poupança que eu tinha quando era criança”, afirma.


Ele lembra que teve de apelar para a ouvidoria do banco onde estava o dinheiro das poupanças dele e dos pais para conseguir os extratos. “O banco sabia que era para entrar com ação na Justiça, então eles demoravam para entregar”, diz.



Para conseguir os comprovantes, segundo o engenheiro, foi preciso especificar o período exato - os meses e os anos. E o banco cobra por cada extrato separadamente. “Hoje estaria em torno de uns R$ 15”, diz Kataoka.


Ações coletivas e individuais


Poderão aderir ao acordo donos de contas-poupança que tiveram prejuízos provocados pelos planos Bresser (1987), Verão (1989) e Collor II (1991). O acordo valerá para quem entrou na Justiça - por meio de ação individual ou coletiva.


Uma das questões levantadas pelos advogados especializados pelo G1 é se quem participa em ação coletiva é forçado a aceitar o acordo. Segundo Estevan Pegoraro, presidente da Frente Brasileira pelos Poupadores (Febrapo), alguns, de fato, não terão escolha. Mas não são todos.


Os poupadores que entraram com execução individual derivada de uma ação coletiva já transitada em julgado podem optar por fazer ou não o acordo. "Nesse caso, se a pessoa não quiser aderir ao acordo, ela segue com a sua execução normal", diz.


Já aqueles que aderiram a ações coletivas que estão suspensas e ainda não foram julgadas, ou seja, pediram "habilitação provisória", não têm escolha.


Já as pessoas que têm ação individual na Justiça podem avaliar se é vantajoso ou não aderir ao acordo. Para esses poupadores, a primeira recomendação dos especialistas é procurar seu advogado para discutir a questão.



Para aqueles que optarem por seguir com o processo, não há previsão de prazo para julgamento e recebimento do dinheiro. “O acordo só existiu, aliás, por causa da morosidade do Judiciário”, opina Berthe.

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