Relatório da OEA reconhece ‘instituições democráticas fortes’ no Brasil

 



Relatório da OEA reconhece ‘instituições democráticas fortes’ no Brasil e contraria extrema direita

O texto foi comemorado pelo governo Lula como uma “retumbante derrota” da extrema direita
Jamil Chade
Jamil Chade

Cruzando fronteiras com refugiados, testemunhando crimes contra a humanidade, viajando com papas ou cobrindo cúpulas diplomáticas, Jamil Chade percorreu mais de 70 países. Com seu escritório na sede da ONU em Genebra, ele foi eleito o segundo jornalista mais admirado do Brasil em 2025. Chade foi indicado 4 vezes como finalista do prêmio Jabuti. Ele é embaixador do Instituto Adus, membro do conselho do Instituto Vladimir Herzog e foi um dos pesquisadores da Comissão Nacional da Verdade.

26/12/2025 | 13h22 


A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) divulgou nesta sexta-feira (26) o Relatório Especial sobre a Situação de Liberdade de Expressão no Brasil.

O informe, segundo o ICL Notícias apurou, já estava pronto há semanas. Ele é o resultado de uma viagem do relator Pedro Vaca ao Brasil. Durante a missão, ele foi alvo de forte pressão por parte de bolsonaristas para que seu texto fosse usado para justificar ações dos Estados Unidos contra o Brasil.

Vaca se reuniu com representantes do ex-presidente, que insistiram em denunciar a suposta ditadura no Brasil. A meta do grupo de extrema direita era de que o documento denunciasse o suposto risco para a democracia brasileira que o atual governo ou o STF representam.

Ainda que o informe alerte para o risco de censura, o texto de Vaca foi comemorado pelo governo Lula como uma “retumbante derrota” da extrema direita na tentativa de usar o órgão interamericano como instrumento de pressão.

Ao longo dos últimos meses, a Comissão Interamericana foi alvo de chantagem por parte do governo de Donald Trump, que apontou que iria suspender repasses para o órgão caso a situação brasileira não fosse abordada.

Em vários trechos, no entanto, as conclusões de Vaca vão na contramão da expectativa dos bolsonaristas.

“A delegação constatou que o Brasil possui instituições democráticas fortes e eficazes, o que se evidencia por declarações e políticas relevantes do Estado destinadas à conformidade com os padrões nacionais e internacionais de direitos humanos. A visita em si é um gesto nesse sentido. Situar o Brasil como um Estado democrático, regido pelo Estado de Direito, é um pré-requisito para compreender a situação do direito à liberdade de expressão no país. O Estado realiza eleições livres e justas, e é caracterizado pela separação de poderes e pelo Estado de Direito, com arranjos constitucionais que garantem a proteção dos direitos humanos”, diz o item 2 da Introdução.

Trecho do relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos)
Trecho do relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos)

Outro trecho, o item 5, cita a tentativa de golpe de Estado ocorrida no país:

“A Relatoria entende que o Brasil passou por tentativas deliberadas de deslegitimar os resultados eleitorais internacionalmente reconhecidos do período eleitoral de 2022, além do planejamento e da tentativa de execução de um golpe de Estado. Nesse contexto, a defesa da democracia no Brasil também é um componente fundamental da defesa do direito à liberdade de expressão no país, uma vez que a liberdade de expressão requer uma sociedade democrática para ser plenamente exercida”.

Mais à frente, o relator observa “uma clara separação funcional dos poderes, autonomia judicial e um sistema de freios e contrapesos em pleno funcionamento. O Brasil dispõe, portanto, de amplos meios para continuar defendendo o exercício da liberdade de expressão”.

Além disso, Pedro Vaca reconhece “a gravidade das tentativas de alteração da ordem constitucional relacionadas ao resultado das eleições de 2022, que levaram à atuação de diversos poderes do Estado”. Segundo o texto, “a própria gravidade dos ataques exige que operadores e operadoras da justiça ajam com rapidez e imparcialidade para determinar definitivamente a culpa de todos os responsáveis”.

Atos golpistas de 8 de janeiro. – Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

O relatório traz uma crítica a políticos de oposição que reclamam de restrição à liberdade de expressão, enquanto usam todos os recursos a seu dispor para censurar adversários.

“Por um lado, alguns dos atores que mais acusam o Estado de censura tentam restringir a livre divulgação das ideias de seus oponentes, chegando a pedir ao Estado que o faça. Também é digno de nota que alguns atores relutam em repudiar eventos do passado recente que foram considerados pela CIDH como ataques à democracia brasileira, ou mesmo as profundas desigualdades estruturais que desafiam a sociedade brasileira”, relata Pedro Vaca.

Mas também há alertas quanto à atuação do Supremo Tribunal Federal, apesar do reconhecimento de sua importância em momento crucial.

“A Relatoria entende que o Supremo Tribunal Federal desempenhou um papel fundamental ao iniciar procedimentos para investigar e resolver essa situação. No entanto, também há preocupações de que essas medidas constituam uma concentração de poder. Embora a defesa da democracia deva fundamentar a ação do Estado, há o risco de transformar uma solução temporária, destinada a ser excepcional, em um problema duradouro, ao criar precedentes que podem ser usados em benefício de regimes potencialmente autoritários no futuro”.

Entre diplomatas, a publicação do informe no dia 26 de dezembro, sem qualquer alarde e nem mesmo o envio por parte da assessoria de imprensa do órgão, revela a tentativa de sufocar seu conteúdo.

Para Raisa Cetra, co-diretora executiva da ARTIGO 19 Brasil e América do Sul, “O relatório da RELE deixa claro que não estamos vivendo atualmente no Brasil um estado de censura e de perseguição política. Ao mesmo tempo em que reconhece que, sim, vivemos ameaças concretas à democracia, particularmente em 2022. 

Ao afirmar que as instituições brasileiras são democráticas faz, exatamente por isso, um chamado a que redobrem seus esforços e medidas para proteger a liberdade de expressão. 

Particularmente de jornalistas e vozes historicamente silenciadas, alvo de discriminações estruturais e de perseguição no ciclo político anterior.”

Procurado, Vaca explicou que apenas pode responder na próxima semana, por estar com “temas familiares” neste dia 26 de dezembro. 

https://iclnoticias.com.br/relatorio-da-oea-reconhece-instituicoes-democraticas-fortes-no-brasil-e-contraria-extrema-direita/

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