Comerciantes de Mogi das Cruzes enfrentam dificuldade na contratação de funcionários
Escala 6x1, baixos salários e equilíbrio entre vida profissional e pessoal pesam na balança dos profissionais na hora de escolher um emprego. Especialista acredita que pandemia acelerou a mudança na forma como novas gerações veem o trabalho.
Por Mariana Queiroz, g1 Mogi das Cruzes e Suzano – 27/08/2025
Salários mais altos, escalas menos desgastantes e maior equilíbrio entre vida pessoal e carreira têm pesado na escolha de empregos.
Os comerciantes de Mogi das Cruzes relatam que vagas permanecem abertas por meses, consequência de mudanças no mercado após a pandemia de Covid-19.
Segundo a recrutadora Aline Zaniboni, há pelo menos dois anos o setor enfrenta dificuldades. “A pandemia mudou tudo. Agora a prioridade para os profissionais é ter tempo de qualidade.”
Um dos principais entraves é a escala 6x1.
“Tenho vaga em shopping há mais de três meses que não consigo preencher. Os candidatos dizem: não quero trabalhar de domingo, feriado, nem de segunda a sábado com apenas um dia de folga.”
Vagas em aberto
Rachid Sleiman, comerciante há 41 anos, está há seis meses com duas vagas abertas. “Em cinco anos, contratei apenas uma pessoa que permaneceu. Os outros saem em 15, 20, no máximo 30 dias, sem motivo definido.”
Uma padaria tradicional do Parque Monte Líbano deixou de abrir aos domingos por não encontrar funcionários.
De acordo com Valterli Martinez, presidente do Sincomércio, há de 30 a 50 vagas abertas no comércio do Alto Tietê. Em setembro, a expectativa é de 1,8 mil a 2,5 mil oportunidades temporárias, crescendo até dezembro com o Dia das Crianças, Black Friday e Natal.
“O comércio tem enfrentado dificuldades para preencher vagas, principalmente em funções ligadas ao atendimento, caixa e vendas. Essa realidade se intensificou no pós-pandemia, quando muitos migraram para outros setores ou para atividades autônomas”, afirma Martinez.
Para reduzir o problema, o Sincomércio criou um programa que conecta empresários e candidatos, oferecendo capacitação em parceria com Sebrae e Sesc.
Mudança de mentalidade
Paul Ferreira, professor da FGV, destaca que a pandemia acelerou a mudança na visão das novas gerações: “Antes, muitos acreditavam que era preciso se sacrificar no presente para ter sucesso no futuro. Hoje, a lógica é aproveitar o momento, mesmo que isso traga mais incertezas.”
Segundo ele, a construção de carreira deixou de ser prioridade. “Com a tecnologia, muitas profissões podem não existir em dez anos. Isso faz os profissionais questionarem se vale a pena se prender a uma trajetória longa.”
Essa mudança também atinge trabalhadores sem qualificação. “Esses trabalhos mais difíceis, com escala 6x1, sempre existiram, mas as pessoas não aceitam mais.”
Mais estudo, mais exigência
Aline Zaniboni acrescenta que o aumento da escolaridade influencia: “Onde os pais conseguem bancar a graduação, os jovens já saem da faculdade buscando cargos na área.”
Ela relata que a escassez atinge também a indústria. “Tenho cinco vagas para mecatrônica, escala 5x2, sem exigir experiência, apenas formação. Mesmo assim, recebo negativas. Os candidatos pedem acima de R$ 3 mil.”
Hoje, segundo ela, a estabilidade é buscada mais pelos empresários do que pelos trabalhadores. “Trocar de emprego por R$ 100 ou R$ 150 a mais no salário virou comum.”
Ferreira reforça: “O trabalho CLT não é mais tão importante. Os jovens buscam equilíbrio entre remuneração e vida pessoal, mesmo que assumam mais riscos no curto prazo.”
Mudança com resultado
Uma hamburgueria de Mogi das Cruzes conseguiu reduzir a rotatividade mudando a escala de 6x1 para 5x2.
Christopher Sousa, que começou como freelancer e hoje é gerente, destaca: “A mudança melhorou em 100% a parte mental. Agora tenho mais tempo com meu filho e esposa.”
O proprietário, Bruno Neris, afirma que apesar de custos maiores, o ganho em retenção compensou: “Rotatividade também sai caro. As empresas precisam se adaptar.”
Estratégias para manter talentos
Para Ferreira, o mercado aquecido dá mais opções aos profissionais. Ele aponta quatro medidas para retenção:
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Melhores pagamentos.
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Flexibilidade geográfica e de horários.
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Desenvolvimento de competências.
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Apoio ao crescimento dentro da empresa.
Ele lembra que modelos como a escala 4x3 têm custos altos, inviáveis para pequenas empresas, mas que o futuro dependerá de maior capacitação e adaptação.
Por Por Mariana Queiroz, g1 Mogi das Cruzes e Suzano