Pesquisa de opinião não é Oráculo de Delfos

O templo de Delfos, cidade da Grécia antiga, era o território onde pontificavam as Pitonisas, sempre chamadas para aliviar as angústias, principalmente, mas não apenas, dos reis e potentados, diante das sempiternas incertezas sobre o futuro. Os crentes de então viam em tais profecias a voz de Deus.

Com base no ditado popular segundo o qual “a voz do povo é a voz de Deus”, os institutos de pesquisa são simulacros modernos do Oráculo de Delfos. No entanto, o laico “retrato do momento” não tem a sacralidade do oráculo. Mostra muita coisa, mas não dá conta da complexidade do real.

O reinício do ano político foi bombardeado por uma infinidade de pesquisas acerca dos mais variados assuntos. Em quase todas, a mídia grande, sempre acionada por lobbies poderosos, enfatiza a piora na avaliação e a perda de popularidade do governo federal. Mas, a rigor, na batelada das atuais pesquisas, levando em conta as margens de erro, o governo eleito por diferença mínima de votos está do mesmo tamanho. Não avançou nem despencou.

Nas enquetes quantitativas de opinião, onde se apresentam alternativas fechadas de resposta, o analista precisa torturar os dados para que eles confessem o resultado que lhe interessa. Ao fim e ao cabo, o contraditório do real sempre fala mais alto. É o que aparece na análise dos dados do DataFolha desta semana.

Ao perguntar sobre a intentona golpista do 8 de janeiro de 2023, o resultado são cartas embaralhadas. Foi golpe ou vandalismo? Para 65%, maioria robusta, foi mero vandalismo. Ao mesmo tempo, outra maioria robusta (63%) se declara contra a anistia aos golpistas. Respostas que expressam a presença do golpe embutido no vandalismo.

No real, conduzidos pelos “kids pretos”, os “patriotas” de porta de quartel botaram pra quebrar à espera de uma GLO que não veio. Felizmente, foram derrotados. E as tendências que se anulam na enquete do DataFolha revelam, mais uma vez, que pesquisa de opinião não é Oráculo de Delfos.