Para não murchar, Bolsonaro precisa de substituto para auxílio emergencial.

 Por: Leonardo Sakamoto

Ao afirmar, nesta terça (15), que seus subordinados estão proibidos de falar sobre "Renda Brasil", Jair Bolsonaro deu início a uma contagem regressiva contra si mesmo. A partir de Primeiro de Janeiro, não haverá mais pagamento do auxílio emergencial, nem programa similar para ficar no lugar. Com isso, a tendência é que o aumento de popularidade que experimentou na pandemia comece a derreter e aprovação volte à época em que "impeachment" era palavra corriqueira...

Para quem não acompanhou a história, o presidente deu um esporro em sua equipe econômica em um vídeo nas redes sociais. Reclamou de estudos que previam tirar de pobre para bancar o tal Renda Brasil, o Bolsa Família anabolizado que ele pretendia deixar no lugar do auxílio....

E por quê? Porque a transferência de R$ 600 por cinco meses e o impacto dela na economia são a principal razão para justificar que, mesmo com a fuga da classe média de sua base de apoio, sua aprovação tenha subido de 32% para 37%, segundo o Datafolha....

Vendo que programas sociais trazem retorno de imagem, ele se lambuzou no auxílio. Perdemos a conta do número de vezes que seu governo o vendeu como o único pai da criança, deixando deputados e senadores em segundo plano...

Com a regra do teto de gastos ainda vigente, limitando o crescimento do orçamento, sua equipe tem que tirar de outra área para bancar o programa. E, convenhamos, a turma do Paulo Guedes é realmente bem criativa na insensibilidade social: estudou o fim do abono salarial, a desindexação de benefícios sociais do salário mínimo e o salário mínimo da inflação. A possível tunga em aposentadorias e pensões de idosos e pessoas com deficiência em situação de miséria foi a gota d'água....

Detalhe importante - com vídeos, como o desta terça, Bolsonaro pratica um de seus esportes preferidos: tirar o corpo fora. Ele andou treinando bastante nos últimos meses, ao repetir, de forma enganosa, que o Supremo Tribunal Federal tirou dele a responsabilidade de tocar a política para enfrentar a covid...

Agora, veio passar sabão em sua equipe mostrando que tem comando. Mas a culpa é principalmente dele, pois colocou Paulo Guedes e suas crenças para gerir a economia do país. A menos que ele ache que dá para fazer uma torta de limão usando frango..

Mirando a conquista da base lulista e a reeleição em 2022, Bolsonaro sabe que seu futuro político depende mais de um programa de transferência de renda parrudo do que do respeito às balizas fiscais e de preocupação com o endividamento...

E, ironicamente, ele pode ser salvo pelo Congresso Nacional uma segunda vez...

No início do ano, ganhou um presentão quando deputados e senadores rejeitaram sua proposta original de um auxílio emergencial de 200 mangos. Com o aviso do fim do Renda Brasil (por mais que seja difícil imaginar que ele não vá tentar anabolizar o Bolsa Família), parlamentares começaram a discutir o andamento de projetos de renda básica que tramitam nas duas casas...

Ou seja, da mesma forma que deixou o trabalho pesado para prefeitos e governadores na pandemia, enquanto se divertia passeando de jet ski, promovendo aglomerações antidemocráticas e xingando jornalista, ele pode deixar o quebra-cabeça para ser resolvido pelo parlamento...

Depois, é só aparecer no final, propor uma leve alteração no projeto, sequestrar a sua paternidade e fazer um monte de lives chamando para si os votos, quer dizer, os méritos...

Caso nada de novo apareça até Primeiro de Janeiro, podemos presenciar sua popularidade, inflada artificialmente, perder o gás se a transferência de renda voltar ao escopo do Bolsa Família (R$ 190 em média e 14,2 milhões de famílias).... 

Talvez seja possível presenciar algumas mudanças em sua aprovação já nos próximos meses, considerando que baixou o auxílio emergencial de R$ 600 para R$ 300 até o final do ano - o que terá impacto na economia se o Congresso não mudar isso também..

Há uma massa de pessoas pobres que não gosta dele, mas que é pragmática a ponto de saber que não faz sentido mudar uma situação que lhe é benéfica. Agora, se isso desaparecer e ficar apenas a imagem de um sujeito grosseiro e que parece mais atrapalhar do que ajudar, apoiar pra quê? *


* Este texto não reflete, 

necessariamente, a opinião do UOL... 

https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2020/09/16/para-nao-murchar-bolsonaro-precisa-de-substituto-para-auxilio-emergencial.htm

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