Imprensa dá mais importância à declaração de Lula que ao extermíno de palestinos

 


 - ICL Notícias

A declaração do presidente Lula na Etiópia, comparando a matança que o governo israelense promove em Gaza ao assassinato de judeus perpetrado por Hitler, virou tema de debate nacional e internacional. Nada mais compreensível. O assunto causa mesmo reações apaixonadas.

Há, inclusive, alguns apoiadores do presidente brasileiro opinando que ele se excedeu. Na mão inversa, as redes sociais desencavaram declarações de intelectuais judeus que disseram exatamente o mesmo que Lula.

Isso mostra a complexidade do debate, e posicionar-se contra ou a favor das palavras do petista, desde que com argumentos honestos, pode ajudar a jogar luz sobre a situação.

Feito esse registro, é preciso destacar que, proporcionalmente, nem a imprensa e nem a direita do Brasil, agora tão barulhentas, deram à mortandade de civis empreendida pelo exército israelense o espaço e a atenção recebidos pela fala de Lula na Etiópia.

Como se sabe, a imprensa deve (ou deveria) dar destaque aos assuntos mais relevantes de cada momento. Se estamos tratando dos ataques do governo de Netanyahu a Gaza, o que é mais importante: discutir as opiniões do presidente brasileiro ou denunciar o assassinato de 29 mil palestinos, a grande maioria mulheres e crianças?

Os dois assuntos são notícia, mas qual deles deve estar nas manchetes?

Desde outubro, em retaliação aos mais de mil mortos e 200 reféns capturados no ataque terrorista do Hamas, o exército de Israel promove um massacre em Gaza. Assassina civis, destrói prédios, invade hospitais para executar aqueles que entende serem terroristas, obriga multidões a deixarem seus territórios, impede a entrada de ajuda humanitária.

Os números são impressionantes. Em quatro meses, 29 mil palestinos foram exterminados. Se somados os feridos e desaparecidos, as vítimas chegam a 100 mil.

Tanto quanto os números, os relatos dos dramas individuais dos aniquilados em Gaza desafiam nosso conceito de civilização. As imagens de corpos ensanguentados estão nas redes sociais para quem quiser ver. Os depoimentos são desesperadores, como o que publicou no jornal O Globo a colunista Dorrit Harazim, uma das boas exceções do jornalismo brasileiro, contando o drama de uma pediatra que recebeu no hospital um bebê de um ano que teve arrancados um braço e uma perna em uma explosão. A criança acabou não recebendo atendimento devido, porque havia casos mais graves (!).

Os que sobrevivem, perdem tudo, da casa à família, passando pela estabilidade psicológica, que um trauma como esse não permitirá jamais recuperar.

Em se tratando de Gaza, o que merece ser mais destacado nos noticiários: a fala de Lula ou o extermínio dos palestinos?

Dê uma olhada nas manchetes e você verá a estranha resposta que os veículos de imprensa dão na prática a essa pergunta.

Por resultado do lobby do governo de Israel ou por pura desumanidade, a mídia tem privilegiado sempre as posições de Netanyahu e seus aliados.

Seja lá por qual motivo for, que fique registrado para a posteridade: o jornalismo brasileiro decidiu normalizar uma das maiores barbáries da história recente da humanidade. 

Chico Alves
Chico Alves

Jornalista, por duas vezes ganhou o Prêmio Embratel de Jornalismo e foi menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog. Foi editor-assistente na revista ISTOÉ e editor-chefe do jornal O DIA. É co-autor do livro 'Paraíso Armado', sobre a crise na Segurança Pública no Rio, em parceria com Aziz Filho. Atualmente é editor-chefe do site ICL Notícias

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