Celso Amorim diz que Brasil negocia com EUA “com o cano do revólver na cabeça”
Celso Amorim diz que Brasil negocia com EUA “com o cano do revólver na cabeça”
Ex-chanceler critica investigação aberta por Trump e afirma que relações entre Brasil e EUA vivem seu pior momento em mais de um século
“A simples ameaça do uso da Seção 301 já cria um tumulto em quem acha que pode ser objeto de sanções unilaterais e é uma forma que torna a negociação muito difícil. É como você negociar com o cano do revólver na cabeça”, disse Amorim, comparando o gesto à aplicação de uma arma econômica.
A investigação foi formalmente aberta na terça-feira (15) pelo Representante de Comércio dos EUA e tem como base a Seção 301 da legislação americana, dispositivo que permite a imposição unilateral de sanções contra países acusados de práticas comerciais consideradas “injustas”. Segundo o governo dos EUA, a apuração tem foco em temas como comércio digital, tarifas preferenciais, medidas anticorrupção, propriedade intelectual e desmatamento ilegal.
Para Amorim, o objetivo da ofensiva é pressionar politicamente o Brasil, recorrendo a instrumentos agressivos de um sistema multilateral em crise. “A bomba atômica das armas comerciais” — como definiu a Seção 301 — revela, segundo ele, a assimetria nas relações comerciais e diplomáticas, agravada pela paralisação do mecanismo de solução de controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC).
“Sem um sistema multilateral funcional, prevalece a força”, advertiu o embaixador.
Declarações da OTAN agravam tensão com o Ocidente
Além da ameaça comercial, o governo brasileiro também foi alvo de críticas do secretário-geral da OTAN, Mark Rutte, que insinuou que Brasil, China e Índia poderiam sofrer sanções secundárias dos EUA por manterem compras de petróleo da Rússia.
A fala foi considerada indevida por Amorim, que reagiu com veemência. “Esta é uma interferência totalmente indevida e mais absurda porque, bem ou mal, é uma organização da qual o Brasil não faz parte nem quer fazer parte. Ele tem que ter um pouco mais de responsabilidade no que ele fala.”
Diplomatas brasileiros apontam que a postura de Rutte se choca com a conduta de países da própria aliança atlântica, como Hungria, Turquia e Eslováquia, que também mantêm relações energéticas com Moscou.
Diplomacia brasileira tenta salvar o diálogo
Horas antes do anúncio da investigação, o governo Lula havia enviado uma carta aos representantes comerciais dos EUA, reiterando a disposição para negociar e propondo alternativas discutidas desde maio. A resposta, até o momento, não veio.
“O Brasil permanece pronto para dialogar com as autoridades americanas e negociar uma solução mutuamente aceitável”, diz o documento, que também ressalta o desejo de preservar “o relacionamento histórico entre os dois países”.
Apesar disso, Amorim considera que os argumentos apresentados por Washington são frágeis e politicamente motivados. Com décadas de experiência diplomática, ele avalia que as atitudes recentes da Casa Branca sinalizam um retrocesso nas relações bilaterais e criam um ambiente desfavorável à cooperação.
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