Como o general Augusto Heleno ajudou a Abin paralela, segundo a Polícia Federal
Como o general Augusto Heleno ajudou a Abin paralela, segundo a Polícia Federal
Por Cleber Lourenço
A Polícia Federal incluiu o nome do General Augusto Heleno Ribeiro Pereira entre os indiciados de uma investigação que apurou o funcionamento de uma estrutura clandestina de inteligência instalada dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Esse esquema, chamado de “Abin paralela” pelos investigadores, foi montado para servir interesses pessoais e políticos, e teria operado fora dos limites legais usando os recursos do Estado brasileiro.
O relatório final do inquérito 2023.0022161 aponta que o general Heleno, enquanto ocupava o cargo de ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), teve papel essencial para a continuidade das ações do grupo criminoso. Mesmo sendo o superior imediato da Abin, Heleno não tomou nenhuma medida quando surgiram denúncias e alertas sobre o uso irregular da ferramenta FirstMile. Essa ferramenta era usada para monitorar, de forma ilegal e sem autorização da Justiça, a localização de pessoas consideradas “alvos” pelo grupo.
Entre os alvos monitorados estavam ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), integrantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), jornalistas, políticos de oposição, servidores públicos e até pessoas comuns. A PF classificou o uso da ferramenta como altamente intrusivo e ilegal, já que ela invadia a privacidade das pessoas sem respaldo jurídico. Segundo os peritos, a contratação da tecnologia foi feita de modo a esconder sua verdadeira função, e o general Heleno, apesar de sua posição de autoridade, não atuou para impedir isso.
O relatório destaca que Heleno manteve Alexandre Ramagem na chefia da Abin, mesmo após sinais claros de que a agência estava envolvida em atividades fora da lei. Ao fazer isso, Heleno teria oferecido o respaldo institucional necessário para que a rede ilegal continuasse a funcionar. Essa omissão é considerada gravíssima pela PF, já que seu cargo exigia vigilância constante e a obrigação de agir diante de qualquer irregularidade.
- A Polícia Federal afirma que a postura de Heleno não foi apenas omissa, mas também colaborativa com o esquema. Ele teria garantido proteção política e institucional à estrutura criminosa. Por essa razão, o general foi indiciado pelos seguintes crimes:
- Organização criminosa (art. 2º, §4º, I da Lei 12.850/2013), por participar de um grupo que atuava de forma estruturada e contínua para cometer crimes com apoio de estruturas estatais;
Abuso de autoridade (art. 23 da Lei 13.869/2019), por deixar de agir para impedir abusos cometidos sob sua responsabilidade, protegendo os envolvidos e permitindo a continuidade das ilegalidades.
Sistemas e recursos da Abin foram usados
Durante a gestão de Heleno no GSI, segundo o relatório, não houve qualquer tentativa de desmantelar ou sequer investigar o funcionamento da estrutura paralela de inteligência. Ao contrário, os sistemas e recursos da Abin continuaram sendo usados para fins políticos, como perseguição de adversários e proteção de aliados. Tudo isso era feito à margem da lei, e com o conhecimento de quem ocupava os cargos mais altos do governo.
O documento da PF mostra que o núcleo político da organização criminosa era responsável por assegurar a estabilidade da estrutura clandestina. Esse núcleo incluía figuras de destaque no governo, como o próprio general Heleno. Eles atuavam para evitar que os responsáveis fossem punidos, garantir acesso aos sistemas de inteligência e permitir que a rede clandestina operasse por anos sem ser desfeita.
A investigação conclui que o papel de Heleno foi estratégico para o funcionamento da ABIN paralela. Sem sua anuência e sem o apoio institucional que ofereceu, os atos ilegais provavelmente não teriam durado tanto tempo. A proteção oferecida por ele ao então diretor da ABIN, Alexandre Ramagem, foi decisiva para manter o esquema ativo mesmo diante de indícios públicos e internos de irregularidades.
Com base nessas evidências, a PF afirma que o general Augusto Heleno não apenas sabia do que estava acontecendo, mas teve papel central para que tudo fosse possível. Sua omissão, aliada à autoridade que exercia, contribuiu diretamente para o sucesso e a longa duração das atividades criminosas realizadas por dentro do próprio Estado brasileiro.