Chineses negociam espólio da Ford no Brasil, e Lula costura acordo com Xi

 

Jamil Chade - 


Investidores chineses podem ficar com os espólios das fábricas deixadas pela Ford, no Brasil. O tema - simbólico da transformação do eixo da relações exteriores do país e da influência americana na economia brasileira - estará na agenda da delegação que viajará com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para Pequim e Xangai, em uma semana.

A visita com mais de 240 pessoas promete ser uma das mais importantes viagens internacionais do novo governo brasileiro, em 2023. Para o governo de Xi Jinping, o encontro a partir do dia 26 vai "elevar a relação a um novo patamar".

Dentro do governo brasileiro, a esperança é de que os chineses aproveitem a viagem para concluir o processo para assumir as instalações que foram deixadas pela Ford, quando a empresa norte-americana abandonou o Brasil. Quem negocia a compra é a BYD, empresa especializada em carros elétricos.

A montadora já está presente no Brasil, inclusive em Manaus. Mas poderia ampliar agora a produção, que também já ocorre no Canadá, Europa e outras partes do mundo.

A Ford encerrou a produção de veículos no Brasil em janeiro de 2021, com impacto nas fábricas em Camaçari (BA) e Taubaté (SP). A decisão encerrou décadas de uma relação estreita com o país e afetou pelo menos 6 mil trabalhadores diretamente, além de milhares de outros que atuavam em empresas que forneciam serviços para a montadora americana.

Mas a questão automotiva não é o único tema na agenda. Segundo membros do alto escalão do governo brasileiro, esses são alguns dos temas que poderão ser tratados entre Lula e Xi Jinping:

5G e semicondutores

Lula poderá visitar a fábrica da Huawei, estratégica no fornecimento de equipamentos de infraestrutura de tecnologia 5G. Se o governo americano continua sua busca por espaço no mercado brasileiro, um encontro de Lula em Xangai com a cúpula da empresa poderia abrir novas portas para investimentos no Brasil e ampliar a cooperação bilateral.

Na agenda ainda está o debate sobre semicondutores, outro item de competição acirrada entre americanos e chineses. O Brasil quer se aproveitar dessa competição para atrair investimentos nessa área. Mas não há garantias de que haja um acordo ainda durante a viagem.

Novo Fundo Climático e investimentos em energia limpa

governo Lula ainda vai debater a possibilidade de que os chineses estabeleçam uma cooperação com o Brasil na questão climática. Uma das ideias sobre a mesa é a criação de um novo fundo bilateral, em moldes parecidos ao do Fundo Amazônia. Mas o maior interesse chinês é o fornecimento de tecnologia, algo que é visto dentro do governo brasileiro como complementar ao que já existe no país para o combate ao desmatamento.

A ausência de um volume significativo de recursos do governo americano para a questão climática no Brasil ainda abriu a possibilidade de que os chineses queiram se apresentar como parceiro do governo Lula também nessa questão.

Há ainda a possibilidade do anúncio de investimentos chineses em energia limpa no estado do Ceará.

Fome

O governo brasileiro espera sair de Pequim com um acordo entre o Ministério do Desenvolvimento Social e do Desenvolvimento Agrário, e os correspondentes na China, para lutar contra a fome e a extrema pobreza. Se o primeiro governo de Lula foi marcado pela questão de acesso aos alimentos para as famílias mais carentes, a constatação do Planalto é que os chineses também desenvolveram nos últimos 20 anos um sólido programa contra a fome e retiraram milhões de pessoas dessas condições, em seu país.

Lula, ao vencer as eleições em 2022, sinalizou que iria ainda formar alianças internacionais para voltar a colocar o tema da fome na agenda dos líderes. Para isso, uma relação próxima com a China também é estratégica, já que o país tem um de seus representantes como diretor-geral da FAO.

Exportação de carne bovina

No setor comercial, o governo quer sair de Pequim com um acordo para voltar a exportar carne bovina. O mercado chinês, em plena expansão, é visto como estratégico para o setor pecuário no país.

O Brasil ainda busca um maior equilíbrio na relação com a China. Apesar de manter um superávit importante, os brasileiros não querem apenas ser um fornecedor de commodities.

Turistas

Outro ponto da agenda e de interesse do Brasil é de que o país seja incluído na lista de destinos prioritários dos turistas chineses. A medida facilitaria a chegada dos estrangeiros e ainda criaria incentivos para pacotes organizados para a população do país asiático.

A esperança do Brasil é de que isso possa alavancar projetos de investimentos na área de turismo. Na Europa, os turistas chineses já estão entre as principais nacionalidades, com gastos que superam muitos países. Tal fluxo obrigou lojas e até estações de esqui a desenvolver programas destinados aos novos turistas, inclusive em chinês.

Cooperação espacial e satélites

Outro ponto da agenda será um possível acordo para a produção de uma nova geração de satélites com os chineses, desta vez equipado com radares. Os aparelhos não teriam função militar, mas seriam usados para monitorar desmatamento na Amazônia e observações climáticas.

A agenda ainda prevê um possível acordo de cooperação espacial.   

https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2023/03/17/chineses-negociam-espolio-da-ford-no-brasil-e-lula-costura-acordos-com-xi.htm

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