Extrema direita se une ao Centrão para tentar outro golpe, o da anistia
Articulação, que tem Tarcísio de Freiras como um dos líderes, está fadada ao fracasso, já que anistiar golpistas viola cláusula pétrea da ConstituiçãoO presidente da Câmara, Arthur Lira, visitou Jair Bolsonaro na última segunda-feira, véspera do início do julgamento do ex-presidente no Supremo Tribunal Federal (STF). Lira não falou sobre o que foi tratado no encontro, mas no dia seguinte tornaram-se públicas as informações de que, aliada ao Centrão, que tem Lira como líder, a extrema direita já conseguiu os votos necessários para aprovar projeto de anistia na Câmara dos Deputados.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, também participa ostensivamente dessa articulação e se deixou fotografar ao lado do presidente do seu partido, o Republicanos, Marcos Pereira, para uma postagem após café da manhã, em que este escreveu: “No cardápio do dia, anistia”. Nesta quarta-feira, Tarcísio se reuniu com o presidente da Câmara, Hugo Motta, que é do seu partido, e também agendou reunião com Silas Malafaia, líder da extrema direita.
Esse movimento indica a preparação de um novo golpe contra o Estado Democrático de Direito, já que a concessão de indulto ou anistia a quem comete esse tipo de crime viola cláusula pétrea da Constituição, definida pelos incisos 43 e 44 do artigo 5o. O primeiro desses dois incisos define:
“A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”.
A lei já foi regulamentada, em 2016. Não trata expressamente da tentativa de golpe, mas essa interpretação é possível com a combinação do inciso 44:
“Constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.”
O STF já analisou esse tema quando julgou o indulto do ex-deputado Daniel Silveira. Na ocasião, o ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente da corte, disse:
"Não podemos confundir liberdade de expressão com incitação ao crime e convocação para a invasão física do prédio das instituições e para agressão física de seus integrantes. Não podemos indultar esse tipo de comportamento", afirmou.
Dias Toffoli fundamentou seu voto, nos seguintes termos, combinando o inciso 43 e 44:
"Tenho muita dificuldade de enxergar, nesse contexto, a possibilidade de aplicação do perdão constitucional aos crimes contra a ordem constitucional e o estado democrático de direito", afirmou Toffoli. O ministro explicou ainda que, embora tais crimes não estejam expressamente mencionados entre os que não podem ser perdoados, a Constituição os define como inafiançáveis e imprescritíveis, dando a eles um status especial.”
Daniel Silveira recebeu indulto de Jair Bolsonaro depois que foi condenado pelo STF por defender o Ato Institucional (AI) 5, instrumento da ditadura militar, para promover a cassação de ministros do STF, visando promover uma “ruptura institucional”. Ele também incitou a população, por meio de suas redes sociais, a invadir o Supremo.
A articulação dos políticos extremistas para afrontar o Supremo e garantir impunidade a Jair Bolsonaro inclui também outras ações. No mesmo dia em que o julgamento no STF começou, os senadores Flávio Bolsonaro e Sergio Moro realizaram audiência no Senado, para desgastar Alexandre de Moraes, o relator do processo sobre a trama golpista.
Tomaram o depoimento do ex-assessor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Eduardo Tagliaferro, com acusações graves contra Alexandre de Moraes. Pelo que foi noticiado, Tagliaferro vazou informações sobre o ministro após ser exonerado do TSE em razão de sua prisão por violência doméstica.
Além do processo por esta acusação, o ex-assessor foi denunciado por violação de sigilo funcional e obstrução da justiça. O Ministério das Relações Exteriores pediu a extradição de Tagliaferro ao governo italiano.
Ele também foi denunciado pelos crimes de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, coação no curso do processo e obstrução de investigação envolvendo organização criminosa. As penas máximas somadas podem chegar a 22 anos de prisão.
Tagliaferro também foi listado como testemunha de Carla Zambelli, presa na Itália enquanto aguarda decisão sobre o pedido do Brasil para que seja extraditada.
A extrema direita movimentou suas peças e o resultado imediato foi carimbar na testa de Tarcísio de Freitas o rótulo de golpista. E é difícil que ele e seus aliados rebatam esta marca. Ele está de olho na candidatura a presidente, com apoio de Bolsonaro.
Mas o Brasil, apontado pela revista conservadora The Economist como país exemplar no combate institucional à extrema direita, endossará o retrocesso representado pelas posições encampadas pelo governador de São Paulo? Não creio.
A condenação de Bolsonaro não encerrará a disputa entre a civilização, hoje no exercício do poder institucional, e a barbárie, que tanta ruína produziu ao Brasil.
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