Poá - Entidade contrata mães com carteira assinada em Poá, SP Mulheres cuidam de crianças cujas famílias perderam a guarda. Almoço em família, reuniões de escola e conselhos fazem parte da rotina.

Pedro Carlos LeiteDo G1 Mogi das Cruzes

mães sociais poá (Foto: Pedro Carlos Leite/G1)Mãe social faz tudo o que uma mãe faz: assiste televisão com as crianças, faz almoço, dá conselhos e outras atividades do cotidiano (Foto: Pedro Carlos Leite/G1)
Há vagas para mulheres em uma entidade de Poá (SP). Entre as atribuições estão receber vários abraços por dia de crianças de todas as idades, administrar seus almoços, horários de escola, cachorro, gato, trocar as fraldas dos mais novos, conhecer as namoradas dos mais velhos. As crianças não são seus filhos, mas a contratada será chamada de “mãe” até na carteira de trabalho. As vagas estão disponíveis em uma organização não governamental chamada Aldeias Infantis SOS Brasil, que acolhe crianças que não podem ficar com suas famílias por decisão da Justiça.
Nas Aldeias - uma entidade internacional que tem 18 unidades no país - as crianças são divididas em grupos entre sete e nove membros e vivem em casas comandadas por uma mulher – a mãe social. Não há distinção de idade e cada casa acolhe crianças de ambos os sexos, com o cuidado de não separar irmãos biológicos.
As casas ficam no que parece um condomínio, com a diferença que as crianças frequentam a escola normalmente, assim como vão ao médico nas unidades de saúde da cidade. “O objetivo é não institucionalizar a criança. A mãe social tem a liberdade de dar 5 reais para a criança comprar pão na padaria da esquina. A única diferença é que ela precisa trazer a nota fiscal para a prestação de contas da casa”, explica Aline Lis Ramos Pereira, assistente de desenvolvimento familiar da entidade.
Atualmente a Aldeia Infantil de Poá tem oito mães sociais, mas precisa de mais três. É preciso ter mais de 35 anos, ensino médio completo, não ser fumante e não ter filhos - ou tê-los já maiores de idade e independentes
mães sociais poá (Foto: Pedro Carlos Leite/G1)Vivem até nove crianças por casa, de ambos os se-
xos e sem distinção de idade (Foto: Pedro Carlos
Leite/G1)
A profissão é regulamentada por uma lei de 1987 – criada justamente pela necessidade de atender as profissionais desta entidade. O salário inicial é de R$ 801,50 mas após receber treinamento e ganhar experiência a contratada passa a receber R$1.200. “A profissão é como outra qualquer, tem férias, folgas, décimo terceiro. Só que é preciso que a mulher faça uma escolha de estilo de vida. A gente compara a escolha de trabalhar aqui como a escolha da vida religiosa. Temos funcionárias que trabalham aqui há 25 anos e para elas a escolha fez sentido”, explica Aline.
'Tem que gostar mesmo de criança'
Atualmente, a casa que a mãe social Maria Divina Gonzaga Costa comanda tem dois meninos de 13 anos, um menino de 11, uma menina de 12, duas adolescentes de 15 e 16 anos e a xodó, uma bebê de apenas quatro meses, que chegou quando tinha 25 dias. “Vai fazer 19 anos que trabalho aqui. Tem muita gente que criei e vem para cá no fim de semana e nas datas de festa”, conta Divina.
Ela começou a trabalhar na entidade quando tinha 25 anos e é difícil dizer que ela seja uma mulher sem filhos, embora nunca tenha dado à luz. “Neste tempo todo são pelo menos 11 as crianças mais próximas que criei. Hoje são todos homens e mulheres formados, mas que vêm sempre me visitar e trazem também os filhos deles”, conta.
Ela afirma que é preciso ter uma motivação muito maior do que a financeira para seguir esta profissão. “Tem que gostar mesmo de criança, porque pelo salário não fica”, avisa.
Todas as mães profissionais concordam que a adolescência é a fase mais complicada. “Precisa ter paciência com adolescente. Tem que ter habilidade, amor, atenção... A gente se apega, para mim eles são minha família também. É uma missão, a gente aprende muita coisa. Não tem essa de abrigo e cuidador. É mãe e filho”, conta Emilia Maria Viana, que já tem dois filhos casados e é avó de dois netos.
O passado das crianças
Uma das crianças que vive na casa de Emilia é o garoto M. de 13 anos. De calça e chinelos, com um jeito tímido, ele está na instituição desde quando tinha apenas um ano de idade. “Já tive umas oito tias”, conta. É assim que as crianças se referem as suas mães sociais. Apenas as crianças que foram criadas desde bebê pela mesma funcionária costumam chamá-la naturalmente de mãe.
mães sociais poá (Foto: Pedro Carlos Leite/G1)Cada casa tem seu mascote. A cadela Poli é mem-
bro da família da mãe social Emilia (Foto: Pedro
Carlos Leite/G1)
Perguntado sobre qual tia ficou marcada em sua memória, o jovem não tem dúvidas. “Foi a primeira, a tia Maria José”. Mas por que? Ele responde com um longo silêncio e tenta tapar o rosto com as mãos.
Também faz parte do dia a dia das mães sociais ouvir as histórias pessoais das crianças. Muitas demoram para contar o que passaram em seus lares antes de chegarem à instituição. “De primeira, ninguém fala nada. É bem depois que elas vão se abrindo. A gente ouve, mas trabalha junto com o pessoal técnico, da assistência social. Quando uma criança chega aqui ainda bebê, são eles que contam aos poucos quem são os pais dela conforme ela vai crescendo”, conta Divina.
Se preparar para sair
Aos 18 anos, o acolhido, já maior de idade, precisa deixar a instituição. “Nós fazemos uma acompanhamento a partir dos 14 anos para que o adolescente vá se preparando, descubra com o que gosta de trabalhar. Depois que ele sai, monitoramos sua situação até os 21”, explica Aline.
A adolescente R., de 16 anos, tem uma rotina como muitas outras meninas de sua idade. Estuda de manhã, almoça em casa com Emilia - sua mãe social – e trabalha à tarde como recepcionista em uma escola de informática. Irmã de outros dois meninos que vivem na mesma casa, ela está com Emilia desde que chegou. “Considero ela como mãe. Dá apoio, dá conselho, não tem como dizer que não é”, conta. “Quando fizer 18 anos quero fazer faculdade de Recursos Humanos”, afirma.
mães sociais poá (Foto: Pedro Carlos Leite/G1)Objetivo é que as crianças vivam em um lar e não fiquem institucionalizadas (Foto: Pedro Carlos Leite/G1)

Postagens mais visitadas deste blog